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A Guerra do Vietnã começou em meados dos anos 1950, mas o envolvimento mais pesado dos Estados Unidos ocorreu a partir de 1965, com o envio de cada vez mais tropas norte-americanas ao conflito. Até então, a população americana sempre apoiara a participação do país nas guerras, especialmente nos dois conflitos mundiais (1914-1918) e (1939-1945). Mas a Guerra do Vietnã dividiria os Estados Unidos.
Boa parte da população, especialmente a mais jovem, foi contra a guerra. As populações negra e latina também, porque viam seus jovens mandados para a linha de frente em proporções muito maiores do que jovens brancos. Os anos 1960 foram a época da contracultura, dos hippies, e havia no país um clima de desconfiança contra o governo, que só cresceu com assassinatos de políticos como John e Robert Kennedy e de ativistas como Martin Luther King e Malcolm X. O país estava rachado.
No fim dos anos 1960, surgia a chamada Nova Hollywood, uma geração de cineastas que queria fazer um cinema mais autoral e livre, sem as amarras comerciais dos grandes estúdios, e os filmes da época começaram a refletir os problemas que esses cineastas identificavam no país. Pela primeira vez, norte-americanos passaram a fazer filmes com uma visão crítica da guerra.
Em 1975, Corações e Mentes, de Peter Davies, ganhou o Oscar de melhor documentário. No ano seguinte, Martin Scorsese dirigiu Taxi Driver que, se não é um filme sobre o Vietnã, tem um personagem principal, Travis Bickle, interpretado por Robert De Niro, que é um atormentando veterano de guerra.
Nos anos seguintes, filmes como Amargo Regresso (1978), de Hal Ashby, Os Rapazes da Companhia C (1978), de Sidney J. Furie, e a obra-prima Apocalypse Now (1979), de Francis Ford Coppola, pintaram um quadro desolador da atuação norte-americana do Vietnã. Mas poucos filmes o fizeram de maneira tão forte quanto O Franco-Atirador.
Lançado em 1978 e dirigido por um jovem de 29 anos que fazia apenas seu segundo longa-metragem, Michael Cimino, o filme chocou plateias do mundo todo por seu realismo brutal. Até Hollywood se curvou e deu ao filme nove indicações ao Oscar e três prêmios importantes, incluindo Melhor Filme, Diretor e Ator Coadjuvante (Christopher Walken). Foi também a primeira indicação de Meryl Streep.
O Franco-Atirador conta a história de três amigos de uma área proletária da Pensilvânia (nordeste dos EUA), vividos por Robert De Niro, Christopher Walken e John Savage, que trabalham numa indústria siderúrgica e matam o tempo caçando veados nas matas locais. Os três se voluntariam para lutar no Vietnã e acabam presos pelos vietcongues e obrigados a participar de macabras disputas de roleta-russa. Essas sequências estão entre as mais violentas e impactantes filmadas no período da Nova Hollywood.
"O Franco-Atirador" chocou os Estados Unidos
O Franco-Atirador chocou os Estados Unidos não só ao mostrar a realidade do combate em longínquas selvas asiáticas, mas porque revelava também os efeitos dele na vida de cidadãos comuns, usados como peões nos jogos de guerra do governo em meio à Guerra Fria. Que um filme tão pesado e triste quanto esse tenha dominado a premiação do Oscar mostra como a Academia estava totalmente em sintonia com o sentimento geral de um país que havia aprendido a desconfiar de seus governantes.
O papel principal do filme foi oferecido a Roy Scheider, recém-saído do megassucesso Tubarão, mas o ator pulou fora duas semanas antes da filmagem, citando “diferenças criativas”. Os produtores conseguiram Robert De Niro como um substituto de última hora, e De Niro sugeriu para o elenco um casal de atores geniais que conhecia de Nova York: Meryl Streep e John Cazale.
Cazale, que havia acabado de fazer Um Dia de Cão com Sidney Lumet e chamado muita atenção pelo papel de Fredo Corleone nos dois filmes O Poderoso Chefão, foi diagnosticado com câncer terminal, e o estúdio queria despedi-lo porque temia que ele morresse antes de terminar a filmagem. O que ocorre então é uma passagem das mais emocionantes: Meryl Streep e De Niro convencem o diretor Michael Cimino a mudar a ordem de filmagem e rodar todas as cenas com o personagem de Cazale de uma vez, no início das filmagens, garantindo a participação dele. E, segundo relatos da época, Robert De Niro pagou do próprio bolso o seguro de vida do amigo Cazale.
O Franco-Atirador foi um grande sucesso comercial, faturando, só nos Estados Unidos, três vezes seu orçamento, mas também foi uma espécie de “maldição” para o diretor Michael Cimino. Com o ego inflado pelo triunfo, Cimino decidiu fazer na sequência a megaprodução O Portal do Paraíso (1980), um faroeste épico que acabou se tornando um dos maiores fracassos comerciais da história do cinema e quase faliu o estúdio United Artists, fundado 80 anos antes por Charles Chaplin e Mary Pickford. Cimino ficaria cinco anos sem filmar e só ressurgiria em 1985 com o policial O Ano do Dragão.
- O Franco-Atirador
- 1978
- 183 minutos
- Indicado para maiores de 18 anos
- Disponível no Filmelier+ (Prime Video) ou para locação no Google Play, Amazon e Apple TV
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