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O ouro teve um desempenho excepcional em 2025. O movimento chamou atenção porque o metal já vinha de uma trajetória forte desde anos anteriores. Para entender essa valorização, vale lembrar um ponto básico: o ouro funciona como reserva de valor e proteção em momentos de estresse, mas não paga juros.
O ouro reage com força quando o cenário externo fica mais difícil de precificar. Em 2025, a sequência de episódios de tensão aumentou o prêmio por proteção. Entraram nesse pacote os embates entre Estados Unidos e China, em especial em torno de políticas tarifárias e medidas de pressão comercial, além do prolongamento da guerra entre Rússia e Ucrânia, com sinais de mudanças no grau de apoio americano à Europa e à Ucrânia. A política fiscal americana também pesou. Déficits elevados e uma dívida já alta em relação ao PIB alimentam dúvidas sobre a trajetória de médio prazo. Isso não significa que os EUA estejam perto de um colapso, mas aumenta a percepção de risco e ajuda a explicar por que parte do mercado passou a buscar alternativas ao dólar e aos títulos americanos como reserva.
Quando se olha para o futuro, não é possível ter muita confiança sobre a direção de variáveis-chave, dado o grau inerente de incerteza no cenário econômico internacional
Como o ouro não rende juros, ele compete com títulos públicos de economias avançadas. Quando o mercado passa a esperar cortes de juros e depois vê esses cortes se materializarem, o custo de oportunidade de carregar ouro diminui.
Para 2026, faz sentido esperar menor probabilidade de repetição do rali de 2025. O ouro já subiu bastante desde 2023 e, quanto maior a alta acumulada, maior a chance de o mercado entrar em uma fase de estabilização ou correção em algum momento. Além disso, o grau de incerteza pode diminuir. O cenário político americano está menos propenso a movimentos extremos, vista a baixa popularidade do governo, e as eleições legislativas de 2026 poderão impor incentivos adicionais à moderação.
No plano geopolítico, também existe a possibilidade de algum acordo no conflito Rússia–Ucrânia e de maior estabilidade no Oriente Médio, ao menos em comparação com os episódios de 2025. A questão fiscal americana, contudo, tende a continuar no radar. A queda dos juros pode aliviar o serviço da dívida e reduzir parte da pressão.
Em síntese, 2026 pode manter um ambiente favorável ao ouro, mas o mercado precisará de um novo choque de incerteza para repetir a intensidade observada em 2025.
O dólar depende de quatro forças principais: incerteza global; política fiscal americana; política tarifária; e ciclo de juros nos Estados Unidos. A inflação americana entra como variável central. Uma inflação mais controlada tende a favorecer a moeda, enquanto tarifas podem empurrar os preços na direção contrária e criar dilemas para a política monetária.
Além disso, a ascensão econômica e geopolítica da China tende a estimular, na margem, o uso de alternativas no comércio e nas finanças internacionais, com o yuan surgindo como um candidato natural em alguns arranjos. Isso não implica substituição rápida do dólar, mas reforça a direção de diversificação.
Quando se olha para o futuro, não é possível ter muita confiança sobre a direção de variáveis-chave, dado o grau inerente de incerteza no cenário econômico internacional. Ainda assim, a análise econômica permite mapear trajetórias potenciais, ajudando a preparar agentes para cenários possíveis e fornecendo bases mais sólidas para o processo de tomada de decisões.
Luciano Nakabashi é doutor em Economia e professor associado da FEARP/USP.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos