PF diz que ex-presidente do INSS recebia propina mensal R$ 250 mil
PF aponta que Alessandro Stefanutto teria recebido propina, inclusive por meio de uma pizzaria, para viabilizar esquema. (Foto: Lula Marques/Agência Brasil.)

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A Polícia Federal afirmou que o ex-presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) Alessandro Stefanutto recebia até R$ 250 mil por mês em propina para permitir os descontos ilegais em aposentadorias e pensões pela Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer).

Stefanutto foi preso durante a nova fase da Operação Sem Desconto. A ação foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça. O caso tramita em sigilo na Corte, mas Mendonça levantou divulgou a decisão no início desta noite.

Stefanutto foi identificado pela PF como um "facilitador institucional do grupo criminoso". Sua participação teria se iniciado com a facilitação jurídica para a celebração do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) da Conafer em 2017. A propina teria sido paga por meio de empresas de fachada, entre elas uma pizzaria.

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“Ele utilizou sua influência na alta administração pública para garantir a continuidade da fraude em massa, que gerou R$ 708 milhões em receita ilícita, confirmando sua posição como uma das principais engrenagens da organização criminosa”, disse a PF.

Do valor total recebido pela Conafer, R$ 640,9 milhões "foram desviados para empresas de fachada e contas de operadores financeiros ligados ao grupo". A corporação afirmou que o pagamento aos altos gestores do INSS “era necessário porque, sem o apoio deles, seria impossível continuar com uma fraude de tamanha magnitude, que envolvia mais de 600 mil vítimas e gerava milhares de reclamações judiciais e administrativas”.

Segundo a PF, Stefanutto “viabilizou juridicamente o esquema fraudulento, conferindo aparência de legalidade a operações ilícitas, mediante o uso da posição pública de destaque que ocupava no INSS”. Ele teria recebido a propina mensal de R$ 250 mil entre junho de 2023 e setembro de 2024, com exceção de um pagamento feito em outubro de 2022.

Planilha de propina do INSS

Durante a investigação, a Polícia Federal encontrou mensagens e planilhas sobre pagamentos a políticos e diretores do INSS com o operador financeiro da Conafer, Cícero Marcelino, e o presidente da entidade, Carlos Roberto Lopes. O formato de “prestação de contas” dos valores ilícitos lembra a planilha da Odebrecht apreendida pela PF na Operação Lava Jato, em 2016. Veja abaixo alguns dos apelidos da planilha de propina do INSS:

  • Alessandro Stefanutto: “Italiano”;
  • André Fidelis, ex-diretor do INSS: “Herói A”; o ex-procurador
  • Virgílio Oliveira Filho, ex-procurador federal: “Herói V”, “Amigo V”, ou “Procurador”;
  • Euclydes Pettersen (Republicanos-MG), deputado federal: "Herói E";
  • José Carlos Oliveira (hoje chamado de Ahmed Mohamad Oliveira), ex-ministro da Previdência do governo Bolsonaro (PL) e ex-diretor de Benefícios do INSS: "São Paulo Yasser".

Segundo a PF, o deputado era "a pessoa melhor paga na lista de propina" e teria recebido um repasse de pelo menos R$ 14,7 milhões por meio de uma loteria e construtora para blindar a Conafer. Pettersen foi alvo de busca e apreensão.

A corporação afirmou que as análises periciais confirmaram que os valores e datas constantes nas planilhas coincidiam integralmente com as transferências bancárias reais.

Ex-ministro de Bolsonaro foi alvo da operação

O ex-ministro da Previdência do governo Bolsonaro (PL) José Carlos Oliveira, que mudou de nome para Ahmed Mohamad Oliveira, também foi alvo de busca e apreensão. APF apontou que ele teve um papel "estratégico" para o "funcionamento e blindagem" do esquema. Ele teria facilitado os descontos ilegais.

“José Carlos ocupou os mais altos cargos da administração pública em matéria previdenciária no Brasil, o que permitiu à organização criminosa manter e expandir o esquema de descontos indevidos em benefícios de aposentados e pensionistas", diz a decisão.

"Trata-se de um agente público que, na perspectiva da representação policial, foi estratégico para o esquema, haja vista que sua atuação foi decisiva para o funcionamento e blindagem da fraude da Conafer”, relatou a PF.

Defesa de Stefanutto, ex-presidente do INSS

A defesa de Alessandro Stefanutto afirmou que “não teve acesso ao teor da decisão que decretou a prisão dele”. Em nota, os advogados afirmaram que “trata-se de uma prisão completamente ilegal, uma vez que Stefanutto não tem causado nenhum tipo de embaraço à apuração, colaborando desde o início com o trabalho de investigação”.

A defesa disse ainda que “irá buscar as informações que fundamentaram o decreto para tomar as providências necessárias” e que “segue confiante, diante dos fatos, de que comprovará a inocência dele ao final dos procedimentos relacionados ao caso”.

Defesa de Euclydes Pettersen

O deputado Euclydes Pettersen disse ter recebido a “com serenidade e respeito às instituições”. “Reitero que nunca tive qualquer vínculo com o INSS, seus dirigentes ou decisões administrativas. Sobre a CONAFER, reafirmo o que já disse em plenário: não tenho relação ilícita com a entidade e nunca participei de sua gestão”, disse o parlamentar, em nota.

“Defendo investigações rigorosas e confio plenamente na Polícia Federal, no MPF e no STF. Estou à disposição para todos os esclarecimentos e certo de que a verdade prevalecerá”, concluiu.

Defesa da Conafer

A Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer) expressou “grande preocupação” com a nova fase da Operação Sem Desconto.

“Nós reafirmamos, com veemência, o princípio basilar do Estado de Direito: a presunção de inocência. Todos os citados nela têm o direito processual e moral de ter sua defesa assegurada e sua honra preservada enquanto não houver decisão judicial condenatória definitiva”, disse a entidade, em nota.

A Conafer criticou o “contexto político e midiático que envolve esta investigação” e disse estar “sendo colocada no centro de uma exposição pública que, a nosso ver, tem traços de cortina de fumaça”.

“Os impactos práticos dessa operação já são evidentes e gravíssimos. A paralisação forçada de nossas atividades prejudica milhares de famílias do campo, povos indígenas e comunidades tradicionais que dependem das ações técnicas, de saúde e de geração de renda promovidas pela CONAFER”, destacou.

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