DNA mais antigo já encontrado.
O sequenciamento do genoma egípcio mais antigo já encontrado gerou inúmeras evidencias sobre a vida antiga. (Foto: Ekke Krosing | Unsplash)

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Pesquisadores de duas universidades de Liverpool, na Inglaterra, conseguiram sequenciar o genoma completo mais antigo já encontrado na história da humanidade. O DNA foi extraído de um esqueleto egípcio preservado por cerca de 4.500 a 4.800 anos, encontrado selado em um grande vaso de cerâmica – uma proteção que permitiu sua sobrevivência ao tempo, ao clima e até aos bombardeios da Segunda Guerra Mundial.

Os restos mortais, descobertos por arqueólogos britânicos na necrópole de Nuwayrat, a mais de 240 km ao sul do Cairo, permaneceram guardados por mais de um século em um depósito na cidade portuária de Liverpool. O DNA, praticamente intacto, foi extraído dos dentes do indivíduo.

Segundo os cientistas, a forma cuidadosa como o homem foi sepultado – típica de egípcios ricos e pertencentes a castas nobres – contribuiu para a preservação excepcional do material genético.

“Quarenta anos se passaram desde as primeiras tentativas de recuperar DNA de múmias, sem sucesso no sequenciamento de um genoma egípcio antigo”, afirmou Pontus Skoglund, um dos autores do estudo publicado na revista Nature.

“O Egito Antigo tem uma arqueologia extraordinária, mas a difícil preservação do DNA impedia registros genéticos comparativos. Com novas técnicas, conseguimos superar essas barreiras e fornecer evidências genéticas de possíveis movimentos populacionais no período”, completa em entrevista à revista.

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A análise revelou que o esqueleto pertencia a um homem adulto, com sinais de desgaste dentário e osteoartrite, indícios de trabalho físico intenso. Ao investigar a presença de fatores químicos nos dentes, relacionados à dieta e ao ambiente, os pesquisadores constataram que o indivíduo provavelmente viveu grande parte da vida no Egito.

Já evidências do esqueleto, usadas para estimar sexo, idade, estatura – assim como obter informações sobre ascendência e modo de vida – sugerem que ele pode ter trabalhado como oleiro, ceramista ou em um ofício que exigia funções braçais semelhantes. Afinal, seus ossos apresentam marcas musculares que levam a crer que o homem passava longos períodos sentado com os membros estendidos.

“As marcas no esqueleto são pistas sobre a vida e o modo de vida do indivíduo; os ossos isquiáticos (da pelve) apresentam tamanho aumentado, os braços mostram evidências de movimentos extensos de ‘vai e vem’, e há artrite considerável apenas no pé direito. Embora circunstanciais, essas pistas apontam para o trabalho em uma olaria, incluindo o uso de torno de oleiro, que chegou ao Egito por volta da mesma época”, explica o professor de Antropologia e Arqueologia, Joel Irish, para a Liverpool Jonh Moores University.

DNA do homem egípcio mais antigo do mundo.Pesquisadores conseguiram sequenciar o genoma completo mais antigo já encontrado na história da humanidade. (Foto: ANIRUDH | Unsplash)

Ademais, análises de isótopos nos dentes sugerem que ele cresceu no Vale do Nilo e seguia uma dieta onívora baseada em trigo, cevada e proteína terrestre, um padrão conhecido para longos períodos da história egípcia.

Do ponto de vista biológico, o estudo estima olhos e cabelos castanhos e pele escura. Porém, com ressalva explícita dos autores sobre as limitações de prever a aparência em populações antigas pouco amostradas.

Ascendência e migração descoberta pelo sequenciamento genético egípcio mais antigo do mundo

Ao analisar seu código genético, os pesquisadores constataram que a ascendência do homem, em sua maioria (80%), corresponde a indivíduos que viveram no Norte da África. Os 20% restantes puderam ser relacionados a povos antigos do Crescente Fértil e da Mesopotâmia, onde hoje encontra-se o Iraque.

Tal descoberta corrobora a evidência genética já defendida por historiadores de que, nessa época, pessoas daquela região migraram para o Egito e se inseriram conjuntamente nas populações locais. Essa migração foi anteriormente evidenciada apenas via artefatos arqueológicos encontrados no Egito.

No entanto, os pesquisadores ressaltam que o sequenciamento deste único indivíduo não pode trazer uma compreensão ampla das ascendências do Egito daquele período.

“Reunir todas as pistas do DNA, dos ossos e dos dentes deste homem nos permitiu construir um quadro abrangente”, comemora Adeline Morez Jacobs, outra responsável pelo sequenciamento genético, em entrevista à Nature. “Esperamos que futuras amostras de DNA do Egito Antigo possam indicar com mais precisão quando começou esse movimento vindo do Oriente Médio.”