Gilmar muda Lei de Impeachment e fecha o Congresso
Quando um poder decide que nada pode contê-lo, o Estado já não é democrático
André Marsiglia - 04/12/2025 13h38

A liminar do ministro Gilmar Mendes — que restringe ao procurador-geral da República o poder de promover processos de impeachment contra ministros do STF é juridicamente indefensável.
O art. 52, inciso II, da Constituição, é cristalino ao afirmar que cabe privativamente ao Senado processar e julgar ministros do Supremo Tribunal Federal por crime de responsabilidade. Gilmar legisla, e legisla mal, ao perverter a literalidade do texto constitucional.
Estamos diante de duas rupturas institucionais graves. A primeira é o desaparecimento completo de qualquer pudor, por parte dos ministros, em violentar a lei. A segunda é ainda mais séria: a Corte não vai recuar para dentro da Constituição. Ela já se reorganiza para enfrentar e neutralizar uma futura legislatura do Senado que, ao que tudo indica, será majoritariamente de direita e tende a ser mais assertiva e menos subserviente.
O parlamentar que, após as eleições, ousar impor limites ao Tribunal encontrará um STF previamente entrincheirado e disposto a rifar o Estado para preservar intactos os poderes extraordinários que lhe foram concedidos com o advento do Inquérito 4781, das “fake news”.
E é preciso dizer com todas as letras: esse estado calamitoso de coisas não surgiu por acaso. Ele é fruto direto da cumplicidade das elites econômicas, acadêmicas e intelectuais — com a entusiasmada colaboração de boa parte da imprensa. Alimentaram o monstro enquanto ele mordia apenas seus inimigos políticos. Autorizaram, aplaudiram e incentivaram a criação de poderes excepcionais sob o discurso de que o risco estava limitado “aos radicais”, “aos bolsonaristas”. Esqueceram que monstros crescem e, quando ganham vida própria, deixam de distinguir quem os alimentou de quem simplesmente os contrariou.
O que começou como “excepcionalidade” virou projeto, um projeto próprio de um STF que já não se contém nem se reconhece dentro de limite algum. E quando um poder decide que nada pode contê-lo, o Estado já não é democrático. Só nos resta uma democracia fingida, que alguns ainda insistem em acreditar possuir.
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André Marsiglia é advogado, professor de Direito Constitucional e especialista em liberdade de expressão. |
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