O que 2025 ensinou sobre o direito do consumidor e o que 2026 exigirá das empresas
O próximo ano exigirá a capacidade de ler um sistema que amadureceu, integrar áreas e decidir antes que o conflito escale
O ano de 2025 consolidou uma mudança silenciosa no ambiente de consumo. Não houve uma ruptura legislativa, mas a combinação prática de quatro fatores que passaram a atuar de forma integrada: a digitalização completa da jornada do consumidor, o aumento das demandas, a consolidação de entendimentos nos tribunais superiores e um consumidor mais informado, conectado e atento à experiência.
Nesse cenário, modelos que funcionaram bem por muitos anos passaram a conviver com um ambiente mais previsível, integrado e exigente. Não se trata de negar o passado, mas de reconhecer uma maturidade do sistema. E sistemas mais maduros exigem decisões igualmente maduras.
Procons em 2025: protagonismo consolidado e impacto direto no contencioso
Há algum tempo os Procons deixaram de ser apenas uma etapa administrativa preliminar. Eles já exercem impacto direto no contencioso e na reputação das empresas, inclusive por meio de rankings públicos, indicadores de reincidência e histórico de conduta cada vez mais acessíveis.
Em 2025, esse papel tornou-se ainda mais claro. Os Procons passaram a ocupar posição central na gestão de conflitos de consumo, funcionando como espaço relevante de filtragem, qualificação e, sobretudo, resolução de demandas que, resolução de demandas que, quando malconduzidas, tendem a migrar para o Judiciário.
A leitura é objetiva. Tratar o Procon como arena prioritária de solução não é concessão nem fragilidade institucional. É decisão racional de governança. Resolver reclamações nesse estágio reduz a judicialização, diminui custos processuais, evita a formação de passivos repetitivos e preserva indicadores reputacionais que influenciam diretamente a percepção do mercado e dos órgãos de controle.
Mais do que responder bem, o desafio passou a ser resolver bem, com consistência, rastreabilidade e demonstração de boa-fé. Empresas que internalizam essa lógica passam a usar o Procon não apenas como canal defensivo, mas como instrumento efetivo de gestão de risco e eficiência econômica, com impacto direto em volume de ações, custo médio por demanda e previsibilidade do passivo.
STF e STJ: previsibilidade como aliada, não como ameaça
Se 2024 já indicava uma tendência, 2025 confirmou. A previsibilidade aumentou. O STJ, ao fixar teses em temas repetitivos, reduziu zonas de incerteza e ampliou a capacidade das empresas de planejar riscos com mais clareza.
Na prática, esse movimento não automatiza condenações nem elimina estratégias defensivas. Ele cria trilhos. E trilhos, para as empresas, são oportunidades de organização. Exemplo disso é a reafirmação de diretrizes sobre responsabilidade por vício do produto e extensão de ressarcimentos dentro dos prazos legais de reparo.
No STF, as discussões sobre responsabilidade civil em ambientes digitais também ganharam densidade, especialmente em temas de repercussão geral ligados à aplicação do CDC em modelos de intermediação e marketplace.
O ponto central é simples. Previsibilidade não elimina estratégia. Ela muda a forma de decidir. Em vez de depender de uma “tese salvadora”, a gestão passa a se apoiar em políticas internas bem desenhadas, critérios claros, coerência na atuação e consistência probatória ao longo da carteira
Onde tudo converge: maturidade do sistema e gestão mais sofisticada
Com Procons mais estruturados, tribunais superiores estabilizando entendimentos e consumidores com mais ferramentas de reclamação e reputação, o risco de consumo deixa de ser apenas jurídico. Ele passa a ser também operacional, informacional e de governança, exigindo integração entre jurídico, atendimento, compliance e áreas de negócio.
Plataformas públicas e bases organizadas de atendimento reforçam essa lógica de transparência, acompanhamento e mensuração. Ambientes mais maduros exigem decisões mais maduras, o que significa tratar a gestão de consumo como tema executivo, apoiado em integração, previsibilidade e consistência
O que 2026 tende a exigir das empresas
2026 não deve reinventar o CDC. Deve exigir que as empresas passem a enxergá-lo como instrumento de governança. Na prática, quatro movimentos ganham relevância:
1) Visão integrada do risco de consumo
A distância entre SAC, Ouvidoria, Procon, consumidor.gov e contencioso diminuiu, exigindo leitura unificada de causas, recorrências e criticidade.
2) Alinhamento entre jurídico, operação e alta gestão
Em setores de escala, o contencioso dialoga diretamente com provisões, eficiência e reputação. O jurídico segue como responsável técnico, com missão ampliada de traduzir risco em decisão executiva.
3) Decisões mais antecipadas, baseadas em precedentes e fatos
Não se trata de trocar análise jurídica por planilha, mas de usar precedentes como referência de política e dados operacionais como base de resposta.
4) Uso inteligente de dados na gestão da resposta
Dados servem para decidir melhor, reduzir ruído, calibrar defesas e demonstrar diligência. Procons e plataformas públicas passam a funcionar como termômetros da qualidade do sistema.
Evoluir não é corrigir, é acompanhar
O que 2025 ensinou é que o Direito do Consumidor passou a operar como linguagem institucional de confiança. E confiança está ligada à capacidade de decidir bem nos detalhes.
Mais do que corrigir condutas, 2026 exigirá das empresas a capacidade de ler um sistema que amadureceu, integrar áreas e decidir antes que o conflito escale. É nesse nível que o Direito do Consumidor deixa de ser reação e passa a ser gestão.
Este artigo encerra a coluna em 2025, em um período que coincide com o recesso forense. O ano seguinte trará novos desafios, e 2026 será mais um espaço para aprofundar debates jurídicos que impactam diretamente as decisões empresariais.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
