polarização
A esquerda quer o direito de gritar sozinha; quando é contestada, resolve criticar a "polarização". (Foto: Imagem criada utilizando Whisk/Gazeta do Povo)

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Estes dias estava tomando uma água de coco no calçadão de Copacabana, e batendo aquele papo superficial com o dono do carrinho e mais dois clientes. Daí um sujeito passa andando rápido pelo calçadão, em frente ao carrinho, e deu para perceber que era alguém conhecido do dono do carrinho. O dono então lhe pergunta: e aí, Fulano, tudo certo? E como vai o seu cachorro?

O sujeito então se vira e responde: “puseram veneno e mataram ele! São esses bolsonaristas! Eles matam todo mundo! Esses bolsonaristas mataram o meu cachorro!” Para tornar tudo ainda mais caricato, o sujeito ainda tinha um adesivo de algum partido vermelho na camisa.

Ele foi logo embora, continuando com o seu exercício matinal, e ficamos nós ali – eu, o dono e os outros dois clientes – meio atônitos. Eu comecei: “o cara é meio radical, não?”, e o dono concordou, dizendo que ele se radicalizou mesmo. Os demais não comentaram nada, mas fizeram questão de pontuar que não comentam sobre política, e que normalmente preferem evitar o assunto. “Eu nem menciono mais política”, disse um deles.

Só faltaram dizer que o problema do país é a “polarização”; e enquanto isso, o comunista ganha no grito. Por que é a direita que tem de se calar? Por que a esquerda pode falar o que quer, mas não pode ouvir o que não quer? Por que essa concessão à hegemonia progressista? Onde está a isonomia?

Por que é a direita que tem de se calar? Por que a esquerda pode falar o que quer, mas não pode ouvir o que não quer?

Eu lembro bem que, nos anos 1990, o grande clichê das redações de vestibular era a “globalização”. Tudo era culpa da globalização, e muitos estudantes recorriam à palavra para explicar qualquer argumento em suas redações. Devido à globalização, o desemprego aumenta no mundo; por causa da globalização, os recursos naturais têm-se exaurido; e assim por diante. A “globalização” era um clichê, um atalho, uma muleta linguística que o sujeito usava mais ou menos quando não tinha a menor ideia do que dizer.

Hoje ocorre algo parecido com o conceito de “polarização”. A polarização está minando a república, separando famílias, envenenando o debate público. É preciso superar a polarização, pacificar as pessoas, encontrar um discurso integrador que possa efetivamente unir o país em torno de um mesmo ideal. Bonito, não?

O problema inicial é óbvio: que discurso de “união” seria esse? Construir estrada? Reduzir o déficit? Privatizar o saneamento? Não usar o fundo eleitoral?

Encontrar esse discurso integrador já seria difícil, porque as pessoas têm diferenças ideológicas mesmo.

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Mas pior que isso, muito embora eu reconheça o valor da construção de estradas e demais políticas gerencialistas, a relevância é mínima para o desafio que a direita enfrenta atualmente. Mais de cem anos depois, nós vivenciamos a era do ressurgimento do comunismo, de uma ideologia totalitária de esquerda que busca impor um regime de censura e coletivismo nas mãos do Estado e do partido. Há muito tempo que nós não víamos uma esquerda tão radicalizada, tão fanática, apoiando todo tipo de arbitrariedades para perseguir opositores e criminalizar o dissenso no país.

A razão de ser, a função principal da direita – e talvez a única função relevante da direita – é conter a esquerda; todo o resto é acessório, e será útil na medida em que sirva a essa causa. Manifestar-se contra a esquerda não significa desunião; muito pelo contrário, é ação fundamental para galvanizar apoio contra a esquerda e, assim, para preservar a democracia.

Eu nem gosto de chamar de “polarização”, porque a palavra faz parecer que se trata de uma patologia do debate público, quando na verdade a polarização é a solução, ou melhor, a polarização é parte do funcionamento regular de qualquer sistema adversarial, como é o caso das repúblicas democráticas. No Brasil sempre tivemos a hegemonia do pensamento único do progressismo, e hoje temos uma alternativa; o debate público do Brasil era em mono, e hoje é em stereo, e isso é salutar.

Toda essa história de polarização é apenas uma armadilha da esquerda, criada para nos fazer aceitar quietos o seu discurso único e hegemônico

O esquerdista quer impor o progressismo à força – e se você não aceitar, vai vilificar, censurar e acusar você e sua família de tudo quanto é crime – e ainda quer nos convencer que, se nós reclamarmos, nós é que somos responsáveis pela “polarização” e por minar a democracia. Essa é uma das especialidades da esquerda: atacar você ao mesmo tempo em que deslegitima qualquer ação sua de autodefesa. Toda essa história de polarização é apenas uma armadilha da esquerda, criada para nos fazer aceitar quietos o seu discurso único e hegemônico.

E muitos de nós, tutelados pela hegemonia progressista, caem nessa armadilha, evitam a polarização e resolvem priorizar a construção de estradas. Vão acabar, evidentemente, construindo estradas e linhas de metrô para o gulag.

Feliz 2026, e que tenhamos um ano de bastante polarização. Sem polarização, temos ou o pensamento único do progressismo, ou a esterilidade do gestor construtor de estradas; e nenhuma dessas vias nos salvará do comunismo.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos