Tela demais bagunça a fome: como o excesso de cliques afeta corpo e mente

Excesso de tela mexe com a fome, a saciedade e o humor; veja por que pausar na hora de comer pode fazer diferença na sua saúde

  • Por Brazil Health
  • 18/11/2025 14h57
wayhomestudio/Freepik Mulher bonita loira sentada em um café Estudos em psiquiatria e psicologia clínica mostram que a hiperestimulação digital altera a regulação de dopamina e cortisol

Vivemos a era dos cliques, um tempo em que o cérebro é estimulado sem pausas. Cada toque na tela, cada notificação e cada rolagem automática disparam pequenas descargas de dopamina. Esse ciclo, o mesmo que gera prazer e recompensa, vem alterando silenciosamente nossa relação com o corpo, com a comida e com o tempo. O cérebro, treinado para buscar estímulos rápidos, perde a capacidade de sustentar a presença. Fica hipermental: acelerado, ansioso, faminto de informação e vazio de pausa. É o retrato de milhares de profissionais (médicos, criadores, empresários, executivos e gestores) que vivem em alerta constante. O mesmo foco que impulsiona grandes resultados, quando não dosado, desorganiza o apetite, rouba energia e apaga os sinais internos de saciedade.

O hipermental e os extremos metabólicos

Quem vive em ritmo mental intenso tende a oscilar entre dois polos. De um lado, o excesso: comer sem perceber, buscando na comida alívio para um cérebro sobrecarregado. De outro, a escassez: a mente tão ocupada que esquece o corpo, e o corpo silencia. Ambos refletem o mesmo fenômeno, a desconexão entre cérebro e corpo, entre pensar e sentir.

Estudos em psiquiatria e psicologia clínica mostram que a hiperestimulação digital altera a regulação de dopamina e cortisol, afetando diretamente os centros de prazer e saciedade. O resultado é um ciclo de busca constante por gratificação, na tela ou no prato, sem satisfação real. Não é só comportamento; é bioquímica. O corpo passa a responder a impulsos externos, não às suas necessidades internas.

A pausa como ato terapêutico

É nesse cenário que a alimentação precisa voltar ao seu lugar de origem: um ato de presença, e não de distração. Comer diante das telas é não comer; é apenas consumir sem sentir. Quando dividido entre a imagem e o alimento, o cérebro perde a percepção da textura, do sabor e até do tempo. Demora mais a liberar os hormônios da saciedade e, em consequência, a pessoa come mais, mas se satisfaz menos.

Desconectar para comer é, portanto, um exercício médico e emocional. É ensinar o corpo a voltar a sentir o ambiente, a cor do prato, o cheiro dos alimentos e o momento do dia. Esses detalhes, que parecem sutis, reconstroem a ponte entre o sistema nervoso e o sistema digestivo. É a ciência da pausa, em que o sistema nervoso sai do modo de alerta (simpático) e entra no de regeneração (parassimpático), permitindo que o corpo absorva o que o cérebro reconhece.

Entre a medicina de precisão e a consciência alimentar

A nova medicina, que une ciência, comportamento e propósito, entende que o apetite é uma linguagem. Não se trata apenas de calorias, mas de comunicação neuroendócrina, emocional e energética. O que sentimos enquanto comemos interfere diretamente na forma como o corpo processa nutrientes e regula o metabolismo.

A medicina de precisão e os avanços em neurociência nutricional mostram que fatores como luz, som, emoção e atenção alteram a liberação de insulina, leptina e grelina. Isso explica por que comer em paz nutre mais do que comer com pressa. E por que a chamada ciência quântica da percepção, que reconhece a influência do campo emocional sobre a fisiologia, ganha espaço como ferramenta de prevenção e longevidade.

Reconectar o humano dentro da era digital

A desconexão digital não é um luxo moderno; é uma medida terapêutica. Não existe alta performance sem pausa, e não existe saúde cerebral sem silêncio. Governos, escolas, empresas e clínicas precisarão reconhecer que a hiperconexão é um novo fator de risco metabólico e mental. Ela adoece silenciosamente a produtividade, a criatividade e o equilíbrio hormonal das pessoas.

Aprender a se observar é o primeiro passo. Saber o que desperta prazer, reconhecer o momento certo de comer, sentir o cheiro e o calor do alimento, respeitar o horário e o ambiente: tudo isso é medicina aplicada. É o que devolve ao corpo a inteligência natural de se autorregular.

Comer, então, deixa de ser automático e volta a ser um ato de consciência. E é nessa consciência que mora a verdadeira nutrição: alimentar o corpo, a mente e o tempo, com equilíbrio, presença e propósito.

Dr. Ordânio Almeida – CRM-SP 210.631
Médico com atuação em Nutrologia, focado em nutrição clínica e qualidade de vida
Membro da Brazil Health