(Foto: Reprodução/ Instagram)

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Vice-prefeito de São Paulo e coronel da reserva da Polícia Militar, Coronel Mello Araújo construiu sua trajetória pública a partir da segurança, área em que atuou por mais de três décadas e na qual ganhou notoriedade pela gestão de unidades estratégicas e pelo perfil considerado linha dura. Na prefeitura, tornou-se uma das principais vozes do governo Ricardo Nunes em debates sobre crime organizado, políticas de segurança e enfrentamentos entre poderes. Ele também ganhou destaque ao assumir funções administrativas e defender a integração entre Estado e município em operações sensíveis, como as ações na Cracolândia. Em entrevista exclusiva à coluna Entrelinhas e ao programa Sem Rodeios, Mello Araújo abordou temas centrais do cenário nacional, como interferências políticas e judiciais, o papel das forças de segurança, o clima eleitoral e a situação jurídica do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Segurança

Entrelinhas: Há um debate sobre equiparar facções criminosas ao terrorismo, mas essa proposta acabou ficando fora do PL Antifcaçção, devido a pressões feitas ao relator, Guilherme Derrite. O senhor acredita que futuras leis que garantam essa equiparação podem fortalecer o combate ao crime organizado?

Mello Araújo: Infelizmente, eu ando meio desacreditado com tudo isso. A gente vê um presidente da República honesto preso e pessoas desonestas, corruptas, soltas e até em cargos de poder. O país está invertido. E o povo não aguenta mais. Ontem mesmo estive com 70 pessoas, e o que todos pedem é segurança. Mas falta boa legislação — e, muitas vezes, porque parte da classe política está envolvida em corrupção ou ligada ao crime organizado, que penetrou em várias instituições.

Entrelinhas: O senhor citou interferência entre poderes. Como isso afeta o combate ao crime?

Mello Araújo: O crime organizado está em todos os setores. Conheço prefeitos, vereadores e deputados envolvidos. Essas pessoas não querem aprovar leis que os prejudiquem. A população pede leis mais rígidas há anos, mas nada avança. Quando a polícia trabalha sem interferência política, resolve — como vimos no Rio de Janeiro. Mas logo depois já houve tentativa de retaliação política.

Entrelinhas: Qual é a sua visão sobre falas do presidente Lula em relação ao crime? Qual é o impacto delas?

Mello Araújo: Ele já defendeu criminosos em várias falas, como quando disse que o traficante era vítima ou que roubar um celular não tem problema. São valores muito diferentes dos anseios da sociedade. Por isso não vejo a possibilidade de projetos avançarem, embora a população deseje endurecimento das leis.

Entrelinhas: Nesse contexto, qual é o papel do Judiciário?

Mello Araújo: Um desembargador me citou o francês François de La Rochefoucauld: "Quando a política entra nos tribunais, a justiça sai pela outra porta". É isso que vivemos. Existem ministros que deveriam ser investigados e não são. Há ameaças veladas a parlamentares caso tomem determinadas decisões. Vivemos insegurança jurídica.

Entrelinhas: Recentemente, o senhor disse que "a Cracolândia acabou e não volta mais". Os senhores resolveram um problema que incomodava a maior parte da população. Mesmo assim, alguns ainda criticam as ações. Como o senhor responde às críticas à operação?

Mello Araújo: É uma hipocrisia o que estamos vendo. Quem faz o certo é atacado. A Cracolândia nunca foi resolvida porque não é só segurança — envolve várias secretarias. Agora funciona porque governo de Estado e prefeitura estão alinhados. Em 2014 já se sabia disso. Não é só prender traficante; é fechar pensões, atender dependentes, oferecer serviços. É trabalho conjunto.

Muitos apareceram depois perguntando “cadê os dependentes?”. Onde estavam quando eles precisavam de ajuda? Muitos usuários não têm discernimento para decidir sozinhos, e não temos legislação adequada. É fácil criticar de fora — difícil é trabalhar na linha de frente.

Eleições de 2026

Entrelinhas: Seu nome tem sido cogitado para o Senado em 2026. Já houve conversas?

Mello Araújo: Nunca. Nem o presidente Bolsonaro nem o presidente do partido falaram disso comigo. Meu foco é ajudar o prefeito Ricardo Nunes. Meu compromisso é com o presidente Bolsonaro e com os eleitores. E espero que ele possa ser candidato, apesar do ceticismo. Tenho fé de que isso mude.

Entrelinhas: Há relatos de que políticos temem que o senhor assuma a prefeitura caso Tarcísio concorra à Presidência. Isso chegou ao senhor?

Mello Araújo: Já. Essa especulação surge porque existe a possibilidade de eu assumir se Bolsonaro não puder concorrer. E muita gente no sistema não quer isso. Administrei a Segurança de São Paulo, fiz a cidade dar lucro, baixei impostos, respeito o dinheiro público — e isso incomoda.

Entrelinhas: O senhor afirma que candidatos fortes têm sido retirados das urnas. Qual é o cenário para o ano que vem?

Mello Araújo: Se estivéssemos numa democracia plena, Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro deveriam concorrer, mas candidatos fortes têm sido tirados do jogo. Qualquer político apoiado por Bolsonaro enfrenta travas do sistema. Nada anda enquanto não votarem a anistia. A liberdade é o mais importante.

Bolsonaro na Papuda?

Entrelinhas: Houve muitas críticas a senadores que visitaram a Papuda. Alguns apontam que seria "derrotismo" dos parlamentares, que estariam aceitando que esse será o destino de Bolsonaro. Qual é a sua opinião?

Mello Araújo: Muitos políticos vivem numa bolha, longe do povo. E o povo sabe o que estão fazendo com Bolsonaro. Ele é militar, e militar deve ficar em estabelecimento militar. Colocá-lo em presídio comum é condená-lo à morte. O processo está errado — assim como o dos militares do 8 de janeiro, que deveriam ser julgados pela Justiça Militar.

Entrelinhas: Qual é a sua maior preocupação hoje em relação à política brasileira?

Mello Araújo: A democracia. O que fazem com o presidente Bolsonaro amanhã pode ser com qualquer um. Antes de falar em Senado ou prefeitura, é preciso restabelecer a liberdade no país. Esse é o ponto principal.

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