A cantora baiana Claudia Leitte |
Defesa de Claudia Leitte afirma que as alterações de letras refletem sua convicção religiosa pessoal e se inserem no âmbito da liberdade de consciência e de expressão garantidas pela Constituição. (Foto: Giuliano Gomes /Arquivo/ Gazeta do Povo)

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O Ministério Público da Bahia ingressou com uma ação civil coletiva contra a cantora Claudia Leitte, acusando-a de prática de intolerância religiosa após a alteração de letras de músicas do axé music em apresentações públicas. A ação tramita na 7ª Vara da Fazenda Pública de Salvador e pede indenização de R$ 2 milhões por danos morais coletivos, além da imposição de restrições à atuação artística da cantora.

O processo tem origem em uma controvérsia iniciada no fim de 2024, quando Claudia Leitte passou a adaptar, em apresentações ao vivo, trechos de músicas do repertório do axé music. Em um dos episódios mais citados, a cantora substituiu a referência à orixá Iemanjá por uma menção a Jesus, utilizando o termo hebraico Yeshua. A alteração, longe de ser inédita na trajetória de artistas que reinterpretam obras à luz de experiências pessoais, foi suficiente para provocar reação organizada de entidades ligadas às religiões de matriz africana. Na época, o MP baiano foi acionado pelo Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro) e abriu uma investigação para apurar a atuação da cantora.

Em janeiro de 2025, o Idafro também tentou impedir a contratação da cantora pelo poder público. Em representação encaminhada ao MP, a entidade defendeu que a prefeitura de Salvador e o governo do estado se abstivessem de contratar Claudia Leitte para eventos oficiais, como o carnaval, sob o argumento de que recursos públicos não poderiam ser destinados a apresentações consideradas ofensivas a religiões de matriz africana. A solicitação não resultou em impedimento formal, mas antecipou o conflito agora levado ao Judiciário.

Cristofobia

Para muitos analistas, a tentativa de punir Claudia Leitte seria um exemplo de "cristofobia" - o ódio, a discriminação ou a violência praticada contra pessoas ou comunidades cristãs em razão de sua fé. Em setembro deste ano, a Câmara Municipal de Salvador aprovou uma lei de combate à cristofobia, apresentada por vereadores como resposta à controvérsia envolvendo a cantora.

O projeto foi defendido como medida de proteção à liberdade religiosa de cristãos e surgiu em meio ao debate sobre os limites entre expressão artística, fé pessoal e intervenção estatal. Para os defensores da medida, não se pode falar em pluralismo religioso quando apenas determinadas crenças são protegidas, enquanto outras são tratadas como ilegítimas ou passíveis de censura.

Enquanto o Ministério Público sustenta que o processo trata de intolerância religiosa praticada pela artista, a defesa de Claudia Leitte afirma que as alterações de letras refletem sua convicção religiosa pessoal e se inserem no âmbito da liberdade de consciência e de expressão garantidas pela Constituição. O caso deverá agora ser analisado pelo Judiciário, que decidirá se a manifestação pública da fé da cantora pode ser enquadrada como violação a direitos coletivos ou se está protegida pelas garantias fundamentais.

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