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Há momentos na política brasileira em que o cheiro de pólvora, de vingança e de guerra é tão evidente que dá pra sentir no ar. Foi exatamente isso que aconteceu depois que Lula anunciou a indicação de Jorge Messias para o Supremo Tribunal Federal (STF). Há cheiro de sangue no ar.
A escolha detonou uma reação explosiva no Senado: Davi Alcolumbre, presidente da Casa e detentor da chave que abre ou fecha as portas do STF a qualquer indicado, declarou guerra contra Lula. É guerra mesmo — com retaliação, pauta-bomba e um risco real de humilhação histórica para o presidente da República.
A indicação de Messias já trazia problemas graves. Ele não é um mero alinhado ao lulismo. Transformou a Advocacia-Geral da União (AGU) numa espécie de escritório jurídico particular do governo, perseguindo opositores, intimidando críticos e instrumentalizando a máquina pública como arma eleitoral.
Exemplos não faltam: ações movidas pela AGU contra parlamentares da direita por “fake news”, investigações sobre o vídeo do Pix feito pelo deputado federal Nikolas Ferreira, um dos maiores adversários do governo e do PT, ações contra críticos da atuação do governo no episódio das enchentes do Rio Grande do Sul, e por aí vai.
A AGU, uma instituição de Estado, foi usada como um departamento de campanha. Messias se tornou algo como um advogado privado de Lula. Hummm... Lembrando de Cristiano Zanin, é o currículo perfeito para quem pretende ser indicado por Lula ao STF. Contudo, pensando no bem comum, é um currículo desastroso para um novo ministro.
E o que podemos esperar de um ministro indicado por Lula com esse histórico? Exatamente o que se desenha: submissão. Se Messias chegar ao STF, reforçará o bloco governista já formado, a “ala norte-coreana do Supremo”, integrado por Cristiano Zanin, Flávio Dino, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes — o grupo que sustenta o lulismo na Corte.
O receio é, assim, que Messias não chegue ao STF para ser juiz, mas para ser mais um político de toga subserviente a Lula e que vai garantir, na base da caneta judicial, a governabilidade que Lula não tem no Congresso Nacional.
Alcolumbre já tinha avisado Lula de que Messias não tinha votos no Senado. O recado não era desinteressado: Alcolumbre é o maior lobista da indicação de seu antecessor e aliado, Rodrigo Pacheco, para a cadeira. Lula, contudo, resolveu forçar a barra. A resposta veio em seguida.
A imprensa noticiou que, após a indicação de Messias, Alcolumbre telefonou para senadores para dizer que votaria contra Messias e trabalharia para derrotá-lo. Além disso, anunciou que levará uma pauta-bomba para ser votada no plenário do Senado na próxima semana: um projeto com impacto estimado em R$ 24,7 bilhões nas contas públicas.
Essa estratégia faz lembrar a pauta-bomba de Eduardo Cunha contra Dilma Rousseff, em 2015, quando aprovou o aumento de gastos públicos, inviabilizando o ajuste fiscal e pavimentando o impeachment. A diferença? Agora, o alvo é o governo Lula e o arquiteto é o presidente do Senado, que já foi aliado e pode vir a ser um adversário fatal.
Mas a verdade é uma só: Alcolumbre só é aliado dele mesmo e de seu projeto de poder pessoal. O que Alcolumbre pode fazer além dessa pauta-bomba? Pode deixar de pautar projetos estratégicos do governo, travar reformas necessárias, aprovar medidas que reduzem receitas ou penalizam Estados governados pelo PT.
Agora, o alvo é o governo Lula e o arquiteto é o presidente do Senado, que já foi aliado e pode vir a ser um adversário fatal
Alcolumbre pode usar a famosa “ordem do dia” como arma: ele tem o imenso poder de decidir o que será votado e quando. Fora a influência que tem sobre senadores e a participação deles em comissões que lhes dão prestígio, verbas, visibilidade e poder. A menos de um ano da eleição, a sabotagem institucional pode ser muito cara ao governo.
O efeito cascata de derrotas, bloqueios e desgaste público pode ser ainda mais devastador em uma gestão já fragilizada pelo escândalo do INSS e pela crise fiscal, que poderá se tornar a mais grave da nossa história — grave o suficiente para fazer o governo parar serviços essenciais por falta de dinheiro em 2027, se nada mudar.
Uma década atrás, o impeachment de Dilma começou com uma queda de braço com o presidente da Câmara e suas pautas-bombas. Lula insistirá em um nome manchado por subserviência institucional, risco de captura política e, agora, pela ira de Alcolumbre?
O Planalto precisará decidir se insiste no nome de Messias ou recua para salvar o pouco que tem de governabilidade. A indicação de Messias representa mais do que escolher um ministro: representa uma aposta política que pode se tornar um imenso erro estratégico.
Tudo isso mostra que a escolha do novo ministro se tornou um cabo de guerra político que objetiva consagrar um aliado fiel na Corte. O país não precisa de mais togados aliados. Precisa de juízes independentes. O nome de Pacheco seria igualmente ruim.
O país merece que a Constituição seja respeitada e que seja escolhido um nome que se notabilize por seu saber jurídico e por sua reputação ilibada, e não pelas amizades e alianças. O problema é que a Constituição não importa mais por aqui.
