Por que o mercado ilegal pode comprometer o futuro das bets licenciadas
Nunca houve tantas regras e mecanismos de integridade, mas o consumidor médio ainda opera sem saber onde está pisando
O estudo “Fora do Radar”, conduzido pela LCA Consultores em parceria com o Instituto Brasileiro de Jogo Responsável e realizado em junho de 2025, revela um cenário que contraria a expectativa criada com a regulamentação das apostas online, em vigor desde janeiro de 2025. O mercado ilegal segue ativo, lucrativo e altamente organizado, mantendo uma base massiva de usuários que ainda não conseguem distinguir o que é legal do que opera à margem.
Mais de 61% dos apostadores brasileiros utilizaram plataformas irregulares ao longo de 2025. Esse fluxo subterrâneo drena bilhões de reais em arrecadação, amplia a vulnerabilidade do consumidor e prejudica operadores licenciados que cumprem as novas exigências regulatórias. A regulamentação trouxe ordem, mas ainda não conseguiu conter a velocidade e a sofisticação das operações informais. O mercado ilegal não encolheu, apenas se adaptou com precisão digital, ocupando espaços deixados pela falta de fiscalização robusta e pela desinformação do público.
Informalidade digital e a vulnerabilidade do consumidor
O novo ambiente de apostas no Brasil vive um paradoxo. Nunca houve tantas regras e mecanismos de integridade, mas o consumidor médio ainda opera sem saber onde está pisando. A pesquisa mostra que 78% dos usuários têm dificuldade para diferenciar plataformas regulares e irregulares, um sinal de desinformação e de uma disputa narrativa que os ilegais vêm vencendo.
Os dados são contundentes. Sete em cada dez apostadores não conseguem verificar a regularidade de um site. Quase metade já depositou dinheiro em plataformas falsas. E 73% utilizaram ao menos um site ilegal em 2025. Esses operadores mudam domínios com frequência, usam servidores internacionais, simulam marcas conhecidas e se apoiam em influenciadores sem qualquer controle.
Esse ecossistema abre espaço para golpes, vício, violações de privacidade e lavagem de dinheiro. Em um setor que exige responsabilidade, rastreabilidade e proteção ao usuário, a informalidade digital tornou-se a principal ameaça à integridade do mercado.
A concorrência desleal que compromete o modelo regulatório
Há um ponto que merece atenção dos tomadores de decisão. Operadores licenciados cumprem regras, pagam impostos, investem em compliance, verificam identidade, estabelecem limites e adotam sistemas de prevenção à fraude e vício. São a base de um mercado que busca maturidade.
Do outro lado, plataformas irregulares operam sem obrigação alguma. Não pagam tributos, não seguem padrões de segurança, usam métodos de depósito proibidos e atraem usuários vulneráveis com incentivos agressivos. O resultado é uma concorrência desleal, em que quem cumpre a lei é prejudicado por quem ignora todas as regras.
A assimetria regulatória ameaça não apenas a concorrência, mas a própria credibilidade do modelo. Sem enfrentamento firme aos irregulares, o arcabouço recém-implantado corre o risco de perder força antes mesmo de produzir resultados consistentes.
O desafio do Estado diante de um problema que é jurídico, tecnológico e transnacional
A regulamentação brasileira é ampla, mas depende de fiscalização contínua e de tecnologia capaz de acompanhar a velocidade dos infratores. Mais de 11 mil domínios ilegais foram derrubados neste ano, mas o ciclo recomeça em poucas horas, impulsionado por servidores internacionais, tráfego criptografado e engenharia digital pensada para evitar rastreamento.
Para enfrentar esse cenário, a política pública precisa reforçar cinco pilares: monitoramento e bloqueio permanentes; cooperação internacional para rastrear operadores e fluxos financeiros; campanhas educativas que reduzam a assimetria de informação; integração entre Fazenda, Senacon, Procons, autoridades policiais e o Sistema de Apostas para ações coordenadas; e responsabilização de influenciadores que promovem sites irregulares sem qualquer transparência.
O combate ao mercado ilegal exige tecnologia, coordenação e consciência institucional. A legislação sozinha não sustenta o processo.
Como o consumidor identifica uma plataforma segura
A regulamentação trouxe ordem e parâmetros claros, mas ainda não foi suficiente para acompanhar a velocidade e a sofisticação das operações informais. Plataformas licenciadas utilizam domínio “.bet.br”, exigem reconhecimento facial no cadastro, realizam verificação de identidade, aplicam limites de tempo e perda, permitem autoexclusão, monitoram comportamentos de risco e operam apenas com métodos de pagamento autorizados, como Pix e débito. Além disso, constam na lista oficial disponível no site do Ministério da Fazenda. Uma regra simples resume a orientação. Plataforma segura é plataforma licenciada.
Um pacto pela integridade do setor
A pesquisa mostra que 87% dos apostadores defendem medidas rígidas contra operadores ilegais. É um recado claro: a sociedade já reconhece a gravidade do problema. Combatê-lo protege o consumidor, fortalece a concorrência justa, aumenta a arrecadação e sustenta a integridade do setor. Trata-se de uma agenda coletiva que depende da ação coordenada entre governo, operadores, entidades e órgãos de fiscalização.
A regulamentação foi um marco, mas ainda insuficiente para equilibrar o jogo. Integridade exige vigilância contínua. Operadores licenciados sustentam o modelo regulatório e precisam ser reconhecidos como agentes centrais de proteção ao público. O país não pode permitir que o mercado ilegal ocupe o espaço construído pela legislação e pelo investimento das empresas sérias.
O debate deixou de ser sobre liberar ou proibir. É sobre formalizar, fiscalizar e proteger. Quando o mercado opera dentro da lei, o jogo deixa de ser risco e passa a ser escolha informada. Esse é o pacto que o Brasil precisa assumir para que o setor prospere com segurança, transparência e responsabilidade.
Integridade não é promessa. É o que separa mercado de sistema e risco de confiança.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
