Pedágio free flow é aquele em que não há cabine de cobrança nem cancela, e o motorista deve ter a tag de pagamento automático no para-brisa ou então pagar pelo site ou, ainda, por um aplicativo de celular em até 30 dias depois da passagem pelo portal de cobrança com o veículo.
Pedágio free flow é aquele em que não há cabine de cobrança nem cancela, e o motorista deve ter a tag de pagamento automático no para-brisa ou então pagar pelo site ou, ainda, por um aplicativo de celular em até 30 dias depois da passagem pelo portal de cobrança com o veículo. (Foto: Célio Messias/Governo de SP)

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Modernização necessária, agilidade, maior arrecadação com menor custo operacional, mais controle, cobrança mais justa e proporcional, menos trânsito, menos acidentes. De nada tem adiantado a tentativa do governo do estado de São Paulo de impor racionalidade ao debate, demonstrando que pode ser melhor assim: desde que começaram a ser implantados nas rodovias estaduais durante a atual gestão, os pedágios free flow (ou fluxo livre, em uma tradução literal do inglês) têm gerado polêmica, críticas e muita dor de cabeça para o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). 

O pedágio free flow é aquele em que não há cabine de cobrança nem cancela, e o motorista deve ter a tag de pagamento automático no para-brisa ou pagar pelo site ou, ainda, por um aplicativo de celular em até 30 dias depois da passagem pelo portal de cobrança com o veículo.

Sob protestos de motoristas de cidades do interior e de prefeitos, de ter sido alvo de ações judiciais, junto com muita pressão nas redes sociais e críticas até de aliados próximos, o governo suspendeu ao menos 12 pedágios “free flow”, planejados para serem implantados em rodovias no interior do estado. Três portais foram cancelados e não serão instalados, outros dois serão instalados mas, a princípio, sem cobrança do pedágio em São Paulo.

Outros cinco que já estavam funcionando tiveram a cobrança suspensa, sem previsão de voltar. Procurada pela Gazeta do Povo, por meio de sua assessoria de imprensa, a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp), responsável pelas regras, fiscalização e regulação das rodovias do estado, inclusive as concedidas à iniciativa privada, não respondeu. A reportagem perguntou quais os motivos da revisão dos 12 pedágios “free flow”, quantos já existem, quantos serão instalados e quais os principais benefícios do modelo, entre outras questões. 

A cobrança pelo sistema “free flow” tem possibilidade de iniciar ainda em novembro na Mogi-Dutra (SP-088) e na Mogi-Bertioga (SP-098), que ligam a cidade de Mogi das Cruzes à rodovia Ayrton Senna (SP-070) e ao litoral do estado. O entrave para o funcionamento do pedágio foi revogado quando o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) derrubou uma liminar que impedia a cobrança em duas rodovias que partem da cidade. 

Em 15 de outubro, a Procuradoria Geral de Mogi das Cruzes entrou com um pedido de liminar para a suspensão da cobrança do "free flow" nas rodovias que partem da cidade, atendido na primeira instância do TJ-SP. "Não tem cabimento o mogiano pagar para entrar e sair da sua cidade", destacou a prefeita Mara Bertaiolli (PL), na ocasião. Foi a primeira ação de uma prefeitura solicitando que o governo estadual suspendesse a cobrança de pedágios em rodovias da unidade federativa. 

No dia 24 de outubro a liminar foi derrubada pelo presidente do TJ-SP, o desembargador Fernando Antonio Torres Garcia. À imprensa local, a prefeitura de Mogi das Cruzes afirmou que recorrerá da decisão e seguirá lutando pelo "direito de ir e vir dos moradores sem custo adicional".

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Projeção era de 58 pórticos de pedágio eletrônico free flow em rodovias estaduais de São Paulo

No início deste ano, o governo chegou a projetar até 2030 a instalação de 58 pórticos equipados com o sistema de pedágio eletrônico free flow em rodovias estaduais nos atuais contratos concedidos à iniciativa privada. Aliados próximos ao governador paulista consultados pela Gazeta do Povo, no entanto, avaliam que o tema é sensível, impopular e pode causar desgaste junto ao eleitorado em 2026.

Dessa forma, o assunto é tratado com uma dose extra de cautela. O tema tem mobilizado a opinião pública. Um levantamento da AP Exata, feito a pedido do Estadão, registrou 6,9 mil publicações únicas sobre o tema no X, TikTok e Instagram pelo período de 30 dias, no final de outubro.

Elas geraram 21 mil comentários e alcançaram cerca de 9 milhões de pessoas. A AP Exata identificou que a maioria das postagens nas redes (63,3%) reprova o free flow em São Paulo. Apenas 25,4% manifestam apoio, enquanto 11,3% são neutras.

Pedágio free flow São Paulo

O deputado estadual Vitão do Cachorrão (Republicanos), correligionário e integrante da “tropa de choque” de Tarcísio na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), virou um dos principais críticos do pedágio free flow. Cachorrão é coautor junto a parlamentares do PT, PSB, PSOL e PCdoB do Projeto de Decreto Legislativo n° 6/2025, que susta o  Decreto nº 68.695, de 11 de julho de 2024, assinado pelo governador de São Paulo, que autorizou a instalação dos pedágio free flow.

O projeto segue em tramitação nas comissões da Alesp. O aliado tem sido um crítico constante da gestão pública estadual contra os novos pedágios. Em um vídeo publicado recentemente em suas redes sociais, por exemplo, ele aparece deitado às margens da Rodovia Raposo Tavares, na altura da cidade de Sorocaba, em frente a um free flow.

"Deitei no chão hoje, ao lado da estrada, como um grito de socorro. Como uma oração. Implorando ao governador Tarcísio de Freitas: 'não ao pedágio free flow em São Paulo!' Eu não aguento mais ver o povo sofrendo”, afirma o parlamentar na postagem, filmada durante um protesto de moradores contra o sistema. 

No dia 3 de agosto, moradores de Cotia fizeram protesto na entrada do bairro Mirante da Mata contra os pedágios na Raposo, entre a cidade e a capital. O alvo principal era o pórtico instalado no km 37,5, que acabou transferido pelo governador.

Outro crítico ao modelo é o deputado Gil Diniz, filiado ao PL, legenda que integra a base de Tarcísio no Legislativo. Ele questiona principalmente as cobranças nos pórticos instalados na Raposo Tavares. Desde 1º de outubro, a rodovia conta com três pontos de cobrança automática, sendo que outros quatro estão previstos até o fim deste ano.

Batalha envolve os parlamentares

O descontentamento com os pedágios free flow não é novo: tem causado polêmica desde que começou a ganhar as rodovias no estado, no segundo semestre do ano passado. Caso o motorista que passe por um free flow não pague a tarifa em até 30 dias, receberá uma multa no valor de R$ 195,23 e perderá cinco pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH). 

Um pedágio de cobrança automática instalado na rodovia Rio-Santos (BR-101), concedida pelo governo federal à iniciativa privada em 2022, aplicou um milhão de multas entre setembro de 2023 e dezembro de 2024, que custaram mais de R$ 200 milhões aos motoristas autuados, segundo levantamento de deputados estaduais apresentado durante audiência pública sobre o tema na Alesp, ainda em abril.

“O governo pegou muita gente de surpresa e começou a aparecer rodovias que foram concedidas e que nos contratos de concessão já havia previsão desses pedágios free flow. As pessoas não sabem o que é, acham que é radar e não tem uma campanha educativa. Aí, quando você vai licenciar o veículo, descobre que tem muitas multas para pagar”, afirmou o deputado estadual Reis (PT), da oposição, durante o evento. 

"Nós não estamos colocando pedágios e pórticos em autoestrada e rodovias, estamos colocando em rodovias secundárias, que as pessoas circulam em sua rotina, é a vida delas que será pedagiada. Mas isso vai afetar todo o estado, porque vai encarecer o frete. Precisamos de um movimento, no mínimo, pela isenção do pedágio para quem for da cidade”, afirmou o deputado estadual Donato (PT), também na audiência pública. 

“Nós não somos a favor desses pedágios. Como os caminhoneiros vão sobreviver? Terão que pagar para trabalhar. Imagina estudantes que moram numa cidade e vão estudar na cidade vizinha. Absurdo. Somos contra mais pedágios, já pagamos IPVA, por que temos que pagar ainda mais pedágios?”, perguntou o aliado do governo Cachorrão, no mesmo encontro.

Antes, os deputados Carlos Cezar (PL) e Danilo Balas (PL) já haviam criticado a iniciativa do governador no púlpito. Ambos também integram a base do governo.

Na casa legislativa, tramitam ainda diversos projetos de lei sobre o tema: há pedidos de deputados para isentar moradores de determinadas regiões; não cobrar tarifa de proprietários de carros de coleção durante os finais de semana e feriados; deixar de exigir a cobrança de públicos específicos, como trabalhadores da saúde ou pessoas com deficiência, além de pedidos para rever a instalação de pontos, entre outros. 

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