Sem disparar novos tiros ou fazer declaração formal de guerra, os Estados Unidos executaram uma das operações mais potencialmente letais contra a ditadura de Nicolás Maduro. O confisco de um único navio petroleiro no Caribe poderá ter o efeito equivalente ao de apertar o botão que corta o oxigênio do regime. Ainda assim, o ditador Maduro tenta vender um ar de normalidade, cantando em público a canção "Don't worry, be happy".
Nesta semana, em ação cinematográfica, os militares americanos desembarcaram de helicópteros no convés do navio Skipper, que tinha bandeira falsa da Guiana e levava petróleo venezuelano escondido para a Ásia. A mensagem foi clara: Washington não precisa confiscar toda a frota clandestina para provocar pânico. Basta provar que tem os meios para apreender quantos navios quiser.
O petroleiro apreendido compõe uma frota paralela, ou quase-pirata, de mais de 1.400 navios envelhecidos, usados para transportar petróleo de países sob sanções internacionais, como Rússia, Irã e Venezuela. Mais de 900 dessas embarcações já estão formalmente sancionadas por Estados Unidos, União Europeia e Reino Unido.
Petroleiros "paralelos" entram na mira
Para escapar da fiscalização, os operadores trocam o nome dos navios, adotam bandeiras de conveniência, ocultam os donos da carga, desligam o transponder e seguem rotas alternativas, desviando de portos que exigem o cumprimento das regras internacionais. Muitos navegam sem o seguro-padrão para esse tipo de carga valiosa. No dia da apreensão do Skipper, mais de 30 navios sancionados aguardavam na costa venezuelana para carregar petróleo.
É nesse mercado cinzento e semiclandestino que o regime de Maduro ainda encontra dólares para sobreviver.
O petróleo responde por quase 90% das exportações da Venezuela. O destino desse óleo é concentrado e politicamente sensível: cerca de 80% vai para a China, 3% para Cuba, de forma subsidiada, e 17% acaba indo, ironicamente, para os próprios Estados Unidos, por meio da gigante Chevron.
Colapso começou com nacionalizações de Chávez, no fim dos anos 90
Antes da chegada de Hugo Chávez ao poder, em 1998, a Venezuela produzia 3,4 milhões de barris por dia. Após nacionalizações, expulsão de empresas estrangeiras e colapso gerencial e tecnológico, a produção despencou para 400 mil barris em 2020. Hoje, gira em torno de 1 milhão de barris diários, em grande parte graças à americana Chevron.
Mesmo assim, apesar de deter cerca de 17% das reservas provadas de petróleo do mundo, a Venezuela responde por apenas 1% do consumo global. Isso significa que apreensões como a do Skipper não causam choque no mercado internacional, mas podem provocar um terremoto nas finanças do regime.
Sanções têm efeito dominó
O petróleo venezuelano já é vendido com grandes descontos no mercado clandestino, justamente pelo risco das sanções. Com a ameaça real de perda total do navio e da carga, compradores tendem a exigir descontos ainda maiores, ou simplesmente recusar pagamentos antecipados.
Sem os petrodólares, a ditadura terá dificuldade para manter o Estado funcionando, pagar tropas, sustentar o aparato de repressão e importar alimentos e itens básicos. Donald Trump já sinalizou que este não será o único navio apreendido.
Se a ofensiva continuar, o fluxo de dólares pode simplesmente desabar. Diante do cerco financeiro, Nicolás Maduro tenta vender normalidade. Em comícios e programas de TV, posa como líder firme, amado pelo povo, repetindo discursos sobre soberania e liberdade.
Num desses eventos, foi além: puxou o coro da música “Don’t Worry, Be Happy”, do americano Bobby McFerrin, e convidou os próprios americanos a cantarem junto. Para um homem que tem sobre a cabeça uma recompensa de 50 milhões de dólares, resta saber se a canção é de resiliência ou será a marca de sua despedida.