O país das sentenças assimétricas
A mão pesada da Justiça cai sobre Bolsonaro, enquanto outra, leve, como pluma abre a cela para Vorcaro
Juliana Leite - 01/12/2025 10h20

Há algo de profundamente indecoroso — quase cômico, se não fosse trágico — na velocidade com que o Estado brasileiro decidiu transformar Jair Bolsonaro em troféu. Um processo correndo com a voracidade de quem finalmente encontrou seu inimigo perfeito, não para julgá-lo, mas para exibi-lo. Nada de escrutínio paciente, nada de ponderação jurídica: apenas a ânsia de “resolver” o problema, de transformar um homem em símbolo, de entregar à plateia a cabeça que ela exige.
E assim… o país se permite esse espetáculo de eficiência seletiva, essa justiça que, como uma caricatura mal desenhada, só corre quando lhe convém.
E enquanto a mão pesada da República cai com fúria quase litúrgica sobre Bolsonaro, outra mão — leve como uma pluma, benevolente como a brisa de um convento — abre as portas da cela para Daniel Vorcaro.
A juíza que o libertou parece encarnar o oposto do rigor: um gesto suave, quase maternal, que transforma crimes financeiros, fortunas suspeitas e tentáculos empresariais em simples questões administrativas. Não há pressa, não há indignação, não há a sombra de um escrúpulo. Apenas a naturalidade burocrática de quem carimba a liberdade de um homem envolto em cifras e favores como se fosse algo inevitável, quase óbvio.
E assim o Brasil segue, tropeçando na própria moralidade: veloz para punir um ex-presidente que se tornou objeto de obsessão ideológica, e morosamente magnânimo com o banqueiro turvo que financiou meio mundo. Dois pesos, duas medidas, e um único país que parece incapaz de perceber a própria farsa — ou pior, plenamente consciente dela, mas indiferente.
A justiça, nesse palco, não é uma balança: é um espelho rachado refletindo, sem pudor, as preferências de quem o manipula.
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Juliana Moreira Leite é jornalista especialista em cultura, escritora e curiosa. Nesse espaço vai falar sobre assuntos da atualidades sob a sua visão. |
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