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A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal formou maioria, nesta terça-feira (18), para condenar nove dos dez réus do núcleo 3, acusados de suposto planejamento de golpe de Estado entre o final de 2022 e 8 de janeiro de 2023.
Sete réus foram condenados por organização criminosa armada, golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Dois deles foram condenados por incitação ao crime e associação criminosa. Além disso, o colegiado absolveu um deles, a saber, o general da reserva Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira.
Agora, com os votos de Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Cármen Lúcia, falta o voto do presidente, Flávio Dino. Depois disso, a Primeira Turma deve votar a dosimetria das penas. A dosimetria é constituída de três fases: fixação de pena-base, aplicação de circunstâncias agravantes ou atenuantes da pena e aplicação de causas de aumento ou diminuição de pena.
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Zanin e Cármen Lúcia acompanham voto Moraes
Logo após o relator, votou o ministro Cristiano Zanin. O voto, de cerca de 40 minutos, limitou-se a acompanhar na íntegra o entendimento de Moraes.
Cármen Lúcia, por sua vez, defendeu a legitimidade das Forças Armadas, dizendo que foram apenas pessoas dentro delas que teriam cometido os supostos crimes. Ela rechaçou a ideia de que oficiais de baixa patente não poderiam influenciar seus superiores. Cármen Lúcia ainda apontou para as acusações contra Hélio Ferreira Lima, Rafael Martins de Oliveira e Rodrigo Bezerra de Azevedo. Contra eles, argumenta, pesam as acusações mais graves, uma vez que dizem respeito ao suposto plano para assassinar autoridades.
Cármen Lúcia também citou as provas apresentadas pelo advogado Jeffrey Chiquini, que defende o tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo. Chiquini apresentou fotos que refutariam a acusação de presença em uma reunião para discutir o suposto plano golpista. Para a ministra, porém, "fotos domésticas" não são capazes de refutar "provas técnicas".
O voto da ministra, um resumo do que juntará aos autos, foi mais longo do que o de Zanin, mas mesmo assim acompanhou o voto de Moraes na íntegra.
Veja as condenações
Condenados por todas as acusações
A Primeira Turma formou maioria para condenar por organização criminosa armada, golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado os réus:
- Coronel Bernardo Romão Corrêa Netto;
- Coronel Fabrício Moreira de Bastos;
- Tenente-coronel Hélio Ferreira Lima;
- Tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira;
- Tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo;
- Tenente-coronel Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros;
- Agente de polícia federal Wladimir Matos Soares;
Desclassificação de conduta:incitação ao crime e associação criminosa
A Primeira Turma formou maioria para desclassificar (reduzir a gravidade) da conduta para incitação ao crime e associação criminosa aos réus:
- Coronel Márcio Nunes de Resende Júnior;
- Tenente-coronel Ronald Ferreira de Araújo Júnior;
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Voto de Moraes beneficiou dois réus e absolveu um
O núcleo 3 é um dos cinco núcleos acusados de planejar um golpe de Estado no Brasil. A acusação aponta para a existência de uma organização criminosa hierarquizada, daí a divisão em núcleos. No âmbito do núcleo 1, também chamado de "núcleo crucial", a Primeira Turma condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos de prisão.
No caso do núcleo 3, as acusações apontam para suposta criação de "desinformação contra o sistema eleitoral", além de tentativa de convencer superiores a aderirem ao suposto plano golpista e um plano de assassinato do então candidato Lula (PT) e de seu vice, Geraldo Alckmin (PSB) e de Alexandre de Moraes. Sobre isso, o relator argumentou que, caso a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentasse denúncia por tentativa de homicídio, ele não poderia julgar o caso, por ser suposta vítima. Ali, porém, a acusação versa sobre crimes diferentes.
Em seu voto, Moraes surpreendeu ao defender, pela primeira vez, a absolvição de um réu. O ministro entendeu que as provas produzidas contra o Theophilo, oriundas da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, não são suficientes para a sua condenação, e aplicou o princípio do in dubio pro reo (na dúvida, beneficie o réu).
A PGR pediu a desclassificação das condutas (mudança para um tipo penal mais brando) de Ronald Ferreira de Araújo Júnior. Em vez de responder por todos os crimes imputados aos demais réus, ele responderia apenas por incitação ao crime.
O relator, no entanto, concordou parcialmente, adicionando o delito de associação criminosa, com pena mais branda em relação ao de organização criminosa. Em seguida, aplicou o mesmo entendimento ao coronel Márcio, por entender que ambos possuem situação similar no processo. O ministro ainda ressaltou que, caso confessem a prática dos crimes, os militares podem fazer jus a um acordo de não persecução penal.
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Entenda a diferença entre associação criminosa e organização criminosa
Embora parecidos, os tipos penais de associação e organização criminosa não são idênticos. Enquanto o crime de organização criminosa exige continuidade, hierarquia e divisão de tarefas, o delito de associação criminosa fala apenas em "associarem-se três ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes."
Os dois tipos penais também estão em locais distintos: enquanto há uma legislação específica para o delito de organização criminosa, prevendo procedimentos especiais de investigação (como a própria colaboração premiada), a associação criminosa está prevista no próprio Código Penal.
Por conta das diferenças, as penas também divergem: para organização criminosa, são três a oito anos de prisão para a modalidade simples, sem armas. Por outro lado, na associação criminosa, a pena varia de um a três anos de prisão.