Durante ciclo de audiências públicas sobre homeschooling no Senado, a atual presidente da Comissão de Educação da Casa se manifestou contrária à pauta. (Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado)

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O projeto de lei que regulamenta a educação domiciliar no Brasil só deve avançar no Senado a partir de 2027. O principal obstáculo à tramitação da proposta é o fato de a senadora Teresa Leitão (PT-PE) ocupar a presidência da Comissão de Educação (CE) até o fim de 2026. O Partido dos Trabalhadores tem posição contrária ao homeschooling, e o tema está longe de ser prioridade da atual presidente da comissão.

Embora a senadora Professora Dorinha (União-TO) tenha apresentado parecer favorável ao PL 1338/2022, que regulamenta a prática, cabe a Teresa Leitão decidir quando a proposta será votada pelos membros da CE. Até lá, a expectativa é que o tema permaneça estagnado, dependendo da escolha do novo presidente da comissão para o próximo biênio (2027-2028).

Segundo Carlos Vinícius Reis, presidente da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned), um consenso de aprovação entre os membros da Comissão de Educação e do Plenário poderia acelerar a tramitação. "Agora é preciso que haja um consenso de líderes; maioria na comissão e no plenário. Mas, até o momento, houve apenas a publicação do parecer, sem nenhuma indicação de ser pautado”, destaca.

Projeto pode seguir direto para sanção presidencial

Dorinha manteve o texto aprovado pela Câmara dos Deputados em 2022, o que pode agilizar o processo legislativo. Caso o Senado aprove o projeto sem alterações, ele seguirá diretamente para a sanção presidencial — última etapa da tramitação. Se houver modificações, o texto retornará à Câmara para análise das mudanças, o que exigirá mais tempo e articulação política.

“Estamos muito agradecidos ao parecer da senadora Dorinha, por ser mais uma manifestação favorável ao reconhecimento do homeschooling", celebra o presidente da Aneed.

De modo geral, os pais educadores estão satisfeitos com o texto, embora apontem pontos que poderiam ser aprimorados. Um dos trechos mais criticados prevê a perda definitiva do direito de exercer a educação domiciliar, caso o estudante seja reprovado por dois anos consecutivos ou três anos alternados.

“Perder esse direito de forma perpétua me parece exagerado. O ideal seria que os pais perdessem esse direito por um período temporário”, avalia Rafael Vidal, fundador da Associação de Famílias Educadoras do Distrito Federal (Fameduc).

Avaliações e fiscalizações trarão burocracia aos pais educadores

Se aprovado como está, o projeto exigirá que os alunos em homeschooling estejam matriculados em instituições de ensino credenciadas para acompanhamento do processo de aprendizagem. Além disso, o conteúdo das atividades deverá seguir a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o que limita o ensino de disciplinas mais clássicas, como latim, ao âmbito extracurricular.

Os pais deverão registrar periodicamente as atividades realizadas e enviar relatórios trimestrais às instituições de ensino em que os filhos estiverem matriculados. Alunos dos ensinos fundamental e médio terão que realizar avaliações anuais de aprendizagem nessas instituições, além de participarem de exames nacionais, como o Saeb, e dos sistemas estaduais ou municipais, quando houver.

“Não temos a ilusão de alcançar uma lei perfeita, porque isso não existe”, declara Reis. “Estamos cientes que esse texto é extremamente restritivo e burocrático. Porém, em que pese ter todos esses condicionamentos e restrições, ele atende ao que foi definido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e trará segurança jurídica para que as famílias possam ter seus direitos respeitados”, complementa.

Sem lei, famílias são condenadas por exercer o homeschooling

O STF, em 2018, reconheceu o direito dos pais de optarem pela educação domiciliar, mas ressaltou a necessidade de uma lei federal para regulamentar a prática. A Corte determinou que a regulamentação deve incluir pontos como supervisão, avaliação e fiscalização por parte do Poder Público e garantir a socialização dos estudantes.

Apesar da decisão do STF não criminalizar as famílias que aderem à prática, a ausência de uma lei tem levado muitas delas a enfrentarem processos judiciais. Um exemplo é o caso de Regiane Cichelero, condenada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) a matricular o filho em uma escola tradicional e pagar multas que somam mais de R$ 100 mil. O caso, infelizmente, abre precedentes negativos para os pais educadores.

“Nós somos um movimento que luta pela liberdade, mas ao mesmo tempo batemos à porta do Estado pedindo regulamentação. É um paradoxo, mas há perseguição jurídica, e precisamos que nosso direito seja respeitado e não mais violado”, enfatiza Reis.

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