
Ouça este conteúdo
Pareceu até que estávamos nos tempos de ouro da Lava Jato: duas operações da Polícia Federal (PF) em dois dias seguidos. Na primeira operação, um esquema de desvios de dinheiro público no Ministério da Educação (MEC), chefiado pelo petista Camilo Santana, que tem como figura central a ex-nora de Lula; na segunda, a prisão do ex-presidente do INSS, nomeado por Lula, e o avanço das investigações contra deputados de vários partidos suspeitos de envolvimento no esquema.
Os dois casos — o do MEC e o do INSS — não são apenas episódios isolados. Eles revelam um mesmo padrão: o retorno do velho modo petista de governar, no qual as estruturas do Estado são loteadas entre partidos e políticos aliados, e a corrupção brota como consequência inevitável da promiscuidade política.
A primeira bomba estourou quando a PF deflagrou uma operação contra desvios de dinheiro público no MEC. O alvo era um esquema de fraudes em licitações envolvendo kits de robótica e livros escolares vendidos a preços superfaturados. A empresa Life Tecnologia Educacional fornecia os produtos, recebia pagamentos inflados e repassava o dinheiro a empresas de fachada.
O escândalo ganhou contornos explosivos quando a PF descobriu quem estava por trás das negociações políticas: segundo as investigações, seria a ex-nora de Lula, Carla Ariane Trindade, que foi casada com Marcos Cláudio e é acusada de atuar como lobista e intermediária entre a empresa e órgãos públicos. Nas investigações, ela aparece com as alcunhas de “Nora” e “Amiga de Paulínia” — nomes de disfarce típicos em esquemas de corrupção.
Pareceu até que estávamos nos tempos de ouro da Lava Jato
Mais: outro investigado é Kalil Bittar, ex-sócio de outro filho de Lula, Fábio Luís, com quem mantinha negócios. E o detalhe mais inacreditável ocorreu durante o cumprimento dos mandados. Quando a PF chegou à casa de Carla Ariane, às seis da manhã, encontrou ninguém menos que o próprio Marcos Cláudio, ex-marido de Carla Ariane e filho de Lula. A presença dele ali levanta perguntas inevitáveis: o que fazia naquele momento? Foi mera coincidência? Teria sido avisado antes da operação? Tentava proteger alguém, intimidar a PF ou destruir provas?
Qualquer hipótese é grave. E agora imagine se os personagens fossem outros: se a PF encontrasse o filho de Bolsonaro numa operação por desvio de dinheiro de um ministério do governo Bolsonaro. As manchetes tomariam os jornais, as emissoras fariam plantão 24 horas e o “escândalo da família” dominaria o noticiário por semanas. Mas, como o sobrenome é Lula, a reação da grande imprensa é o silêncio conveniente — aquele silêncio cúmplice de quem, com os bolsos cheios de patrocínios e os olhos embaçados pela ideologia, passa pano para a corrupção “do bem”.
Enquanto a lama da corrupção no MEC ainda respingava no governo, a segunda bomba estourou no dia seguinte, bem no coração da Previdência Social. A PF prendeu Alessandro Stefanutto, ex-presidente do INSS, indicado pelo ex-ministro Carlos Lupi, do PDT — o mesmo Lupi que Lula escolheu para comandar o Ministério da Previdência. O mesmo Lupi que havia sido afastado no governo Dilma por suspeita de corrupção.
Stefanutto é acusado de liberar descontos fraudulentos em aposentadorias de milhões de brasileiros, beneficiando associações e empresas suspeitas de desviar o dinheiro de aposentados humildes. Para isso, receberia uma mesada de até 250 mil reais por mês apenas por conta das fraudes comandadas pela CONAFER, a Confederação Nacional dos Agricultores, que teria recebido mais de 640 milhões de reais do esquema.
A estimativa inicial de prejuízo era de 6 bilhões de reais. Hoje, fala-se em até 90 bilhões — mais do que o dobro do total do prejuízo estimado na Petrobras durante a Lava Jato. Noventa bilhões retirados das mãos de quem trabalhou a vida inteira, confiou no sistema e hoje sofre para pagar o remédio no final do mês.
O esquema, segundo a investigação, só existia porque o INSS fechava os olhos. Mesmo depois de alertas formais sobre as fraudes, a cúpula da Previdência não fez nada. Agora, sabe-se que a chefia do INSS não apenas fechava os olhos, mas colocava a mão na botija. O próprio ex-presidente do órgão está atrás das grades. É impossível dissociar esse escândalo da cadeia de comando que o sustentava.
Stefanutto foi nomeado por Lupi, e Lupi foi nomeado por Lula. O fio da responsabilidade sobe direto até o Palácio do Planalto. A prisão do presidente do INSS coloca a investigação a dois passos de Lula. Um fator complicador para Lula e o governo é que o caso é conduzido pelo ministro André Mendonça, no Supremo Tribunal Federal (STF), um dos poucos ainda comprometidos com a Constituição e com o combate à corrupção.
O Brasil aguarda para ver se o governo agirá com transparência e afastará os envolvidos ou se tentará abafar o caso com o silêncio cúmplice que se tornou marca registrada do lulismo. Esses dois episódios revelam o mesmo DNA: aparelhamento, loteamento, favorecimento, propinas, desvios. Tudo fruto da impunidade — e essa Lula conhece bem.
O Estado é tratado como extensão do partido; os cargos, como moedas de troca; e a corrupção, uma consequência inevitável desse sistema, virou a regra do jogo. Foi assim na Petrobras, nos Correios, no BNDES — e agora, tudo indica, no INSS e no MEC. A diferença é que hoje há menos indignação pública e mais complacência institucional.
O governo que prometia ética devolveu o Brasil à velha normalidade do petismo: escândalos que sobem a rampa do Planalto e esperam pela impunidade, costumeiramente disponível para os amigos do rei. Enquanto crianças em escolas e aposentados são lesados, Lula se cala. Apenas o velho script de sempre: negar, culpar os outros e torcer para que o tempo enterre o assunto.
Mas há algo que o tempo não apaga: a verdade. E a verdade incômoda, a verdade grave, a verdade escandalosa, por vezes, incendeia o povo. E a verdade hoje é que o rastro da corrupção está cada vez mais próximo do presidente da República. Parece o roteiro de um filme a que já assistimos.
