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Há escândalos que expõem não apenas um governo, mas o próprio espírito que o move. A revelação de que a Advocacia-Geral da União (AGU) sabia das fraudes bilionárias no INSS desde o começo de 2024, mas nada fez por mais de um ano, é de chocar. Mais do que chocar, ela põe em xeque a viabilidade política e ética da nomeação para o STF de Messias, mais conhecido como “Bessias”, no comando daquele órgão desde 2023.
Conforme revelou o Estadão, no começo de 2024, a Corregedoria da AGU detectou um volume anormal de ações judiciais envolvendo fraudes em empréstimos consignados e descontos associativos indevidos. Evidências de fraudes saltavam aos olhos. Isso já seria suficiente para acender todas as luzes vermelhas.
Em seguida, em julho de 2024, unidades internas da própria AGU sugeriram a suspensão dos convênios do INSS com as entidades privadas que estavam roubando sistematicamente os aposentados. Em outubro daquele ano, o relatório com essa orientação foi formalmente aprovado.
E então... silêncio. Nada. Nenhuma ação concreta. Nenhum acionamento do INSS, da Controladoria-Geral da União (CGU), da Polícia Federal (PF) ou do Judiciário. E, como não poderia deixar de acontecer, o rombo continuou crescendo, até explodir como o maior escândalo de corrupção da história previdenciária do país.
Não estamos falando de um relatório periférico, de alertas de irregularidades feitos por pessoas desconhecidas ou sem credibilidade. Estamos falando de um alerta formal, produzido pela própria Corregedoria da AGU, indicando fraudes em massa contra aposentados e pensionistas, e ignorado deliberadamente pela liderança do órgão pelo qual Messias é responsável.
Evidências de fraudes saltavam aos olhos. Isso já seria suficiente para acender todas as luzes vermelhas
Mas há um detalhe que torna tudo ainda mais eloquente: a AGU tinha conhecimento, antes de todos, de irregularidades nos descontos feitos pelo Sindnapi — o sindicato comandado pelo irmão de Lula, o Frei Chico. O órgão que deveria proteger os cofres públicos e os aposentados ficou inerte justamente quando o rastro da fraude levava a um grupo conectado ao governo, comandado pelo irmão do presidente.
E a AGU hesitou de novo quando, após o escândalo tomar o noticiário, deixou de incluir o Sindnapi no pedido de bloqueio de recursos das entidades suspeitas. A pergunta é inevitável: por quê? Por que agir como uma onça contra réus do 8 de janeiro, cobrando deles mais de 50 milhões de reais em indenização e, ao mesmo tempo, agir como um gatinho manso diante de fraudes que atingem velhinhos de 70, 80, 90 anos?
E isso nos leva à responsabilidade direta da AGU, da qual Messias não consegue escapar. Se um relatório interno detecta fraude de grande magnitude, a obrigação legal e moral é agir imediatamente: acionar a PF, pedir providências à CGU, provocar o INSS, adotar medidas cautelares no Judiciário.
Vamos lembrar que a AGU faz tudo isso quando interessa politicamente. Fez para cobrar os pobres envolvidos nos atos de 8 de janeiro. Fez para processar opositores e críticos do governo Lula. Fez até para perseguir memes na internet. É só pesquisar: o noticiário está cheio de ações proativas da AGU em favor do governo Lula.
Mas, quando se trata de escândalo que respinga no governo, quando envolve entidades próximas ao núcleo lulista, quando o cheiro de queimado chega perto demais do Planalto... aí a disposição some. A coragem se evapora. E o órgão que deveria defender o patrimônio público vira espectador complacente e omisso.
O impacto político disso é, e deve ser, devastador. A indicação de Messias ao STF, já cambaleante, corre agora sério risco de desabar de vez. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, levantou o cenário atual: Messias teria no máximo 31 votos — precisa de 41. E isso antes do estouro dessa bomba.
Agora, Messias carrega nos ombros não apenas a missão de explicar a omissão da AGU, mas a suspeita generalizada de que sua inação serviu, no mínimo, para proteger o governo de um desgaste político monumental. E sua omissão piorou tudo. O gato subiu no telhado, e a indicação de Messias passou a custar muito mais caro para Lula, tanto politicamente quanto moralmente.
No fundo, esse episódio é revelador. Ele mostra como o governo Lula age quando o problema atinge seus aliados e seus interesses. Não há pressa, não há rigor, não há indignação. E o dano? Quem paga é o aposentado, o vulnerável, o brasileiro que trabalhou a vida inteira. Depois de descoberta a participação do próprio governo na fraude, quem paga agora somos todos nós.
O governo que prometia cuidar dos pobres não os protegeu da maior fraude previdenciária já identificada. Mas é pior do que isso. As provas sugerem que o governo, com uma das mãos, por meio do chefe do INSS, roubou os velhinhos. Com a outra das mãos, por meio da AGU — e, diga-se também, do ministro da Previdência, que foi avisado e igualmente se omitiu — protegeu e acobertou o roubo. O governo sabia — e nada fez.
O ministro da Previdência omisso caiu. A pergunta que fica agora é simples: o AGU vai se sustentar no cargo? Um nome manchado por uma omissão tão grave merece ser indicado para uma vaga na Corte Suprema? E, se Lula tiver essa ousadia, será que o Senado, mais uma vez, vai fingir que não viu?
