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O secretário nacional de segurança pública, Mário Sarrubbo, lamentou nesta segunda (10) a escolha do deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP) para relatar o projeto de lei elaborado pelo governo que pretende endurecer as penas para as facções criminosas, o chamado PL Antifacção, que deve ir a votação ainda nesta semana. Ele pediu que a análise no plenário da Câmara dos Deputados seja adiada com mais discussão com o governo.
A escolha de Derrite foi feita pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), na última sexta (7) e classificada pela base governista como “furto com abuso de confiança”. Isso, porque, o agora secretário licenciado de São Paulo endureceu ainda mais o texto enviado pelo governo com tipificações que, dizem aliados, podem levar a uma insegurança jurídica.
“Estamos assustados e decepcionados. Construímos um projeto de lei junto com a academia, com as forças do Sistema Único de Segurança Pública, com o Ministério Público, a sociedade civil, depois houve uma ampla discussão dentro do Ministério da Justiça. Esse trabalho começou em agosto de 2024, pensamos demais, ouvimos vários segmentos. [...] Me parece uma coisa feita muito às pressas que quebrou toda a sistematização da legislação penal brasileira, com algumas inconstitucionalidades e incongruências”, disparou Sarrubbo em entrevista à GloboNews.
Sarrubbo criticou a escolha de Derrite afirmando que foi feita no momento em que estava em um voo para Brasília e que, antes mesmo de pousar, já havia um relatório pronto de cerca de 40 páginas que, na visão dele, foi elaborado às pressas na comparação com o tempo que o governo levou para organizar a proposta.
“É uma reforma, na verdade, que reforça a lei Antiterrorismo, e não a lei das organizações criminosas, que era a proposta. Quero fazer um apelo ao Congresso que não vote isso na quarta-feira, para fazermos um debate mais amplo. Do jeito que está essa proposta, todas essas medidas cautelares citadas não serão aplicadas às organizações criminosas, mas só a aquelas que foram praticamente equiparadas a ações terroristas, de maneira que várias organizações criminosas ficarão sem esses novos mecanismos, e teremos dificuldades para investigar aquelas que atual no campo cibernético, financeiros e assim por diante”, pontuou o secretário.
O parecer com essas alterações foi protocolado ainda naquela noite e está pronto para votação, que pode ocorrer nesta semana. Derrite incluiu o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital (PCC) na Lei Antiterrorismo, uma medida fortemente defendida pela direita principalmente após a megaoperação policial no Rio de Janeiro há quase duas semanas.
“No geral, encontramos inúmeras incongruências e acreditamos que é um projeto que olha para o ‘andar de baixo’, na medida em que não faz distinção entre liderança de organizações criminosas, mas coloca todos na mesma toada, e não olha para o ‘andar de cima’. É muito preocupante”, completou Sarrubbo afirmando que há um “risco” de “desestruturar o sistema penal e processual brasileiro”.
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O texto original do governo institui a figura da “organização criminosa qualificada” dentro da Lei de Organizações Criminosas (Lei nº 12.850/2013). Esse crime seria tipificado quando a organização buscasse o controle de territórios ou atividades econômicas mediante uso de violência, coação, ameaça ou outro meio intimidatório. Derrite, no entanto, considerou essa opção "frágil" e tecnicamente inadequada.
O deputado defendeu que atos de domínio territorial armado e intimidação coletiva, que desafiam a autoridade do Estado, são de natureza "eminentemente bélica e subversiva da ordem pública". Com isso, o substitutivo insere essas condutas no novo Artigo 2º-A da Lei Antiterrorismo (Lei nº 13.260/2016), como:
- Utilizar violência ou grave ameaça para impor domínio sobre áreas geográficas, comunidades ou territórios;
- Impedir, dificultar, obstruir ou criar embaraços à atuação das forças de segurança (inclusive mediante barricadas, bloqueios ou incêndios);
- Sabotar, inutilizar ou interromper o funcionamento de serviços públicos essenciais, hospitais, escolas, portos, aeroportos ou instalações de energia e petróleo.
“Procuraram equiparação quase que banalizando as ações terroristas. Terrorismo, em qualquer país do mundo, é uma exceção para determinadas circunstâncias, e não para qualquer atividade criminosas. [...] Aí pesou a questão ideológica, ficou aquela ideia de ‘se não dá pra transformar efetivamente em terrorismo, vamos fazer com que esta legislação fique equiparada, sem transformar em terrorismo”, completou Sarrubbo afirmando que a proposta atende a um “clamor da extrema direita” ideológico.
Ainda segundo Mário Sarrubbo, a “desestruturação do sistema penal e processual” levaria a uma disputa nos tribunais que poderia anular decisões por conta de divergências entre os tipos penais abordados.



