Conheça a história dos tintos de Fronsasc, ótima opção de vinhos de Bordeaux ‘raíz’

Vinhos de Fronsac costumam envelhecer bem e muitos exemplares ganham complexidade entre 5 e 12 anos, e os melhores châteaux podem ultrapassar 15 anos em garrafa

  • Por Esper Chacur Filho
  • 16/11/2025 10h00
Arquivo Pessoas/Esper Chacur Filho vinho Vinhos de Fronsac costumam envelhecer bem

Os vinhos sempre pautaram a História, seja de uma civilização, de um país, de um povo ou de uma família. Sempre esteve presente em cada brinde de vitória e sempre serviu para esquecer a derrota (vide Napoleon). Alguns vinhos carregam um lirismo ímpar, como é o caso dos tintos de Fronsac. Antes do vinho, importante conhecer um pouco desta sub região.

A comuna de Fronsac situa-se no departamento da Gironde, na região Nouvelle-Aquitaine, na margem direita do estuário da Gironde. O local é habitado desde a Pré-História (vestígios paleolíticos e neolíticos) e recebeu influência gaulesa e romana — há registos de um mercado gaulês e de um altar romano. No período medieval Fronsac ganhou importância estratégica (fortificações no tertre de Fronsac) e, mais tarde, passou pelas mãos de famílias reais/nobres (a casa de Richelieu contribuiu para a fama local no século XVII). A própria denominação vinícola toma o nome da comuna.

Em termos étnico-culturais, Fronsac pertence ao âmbito histórico do “Fronsadais” e do Bordéus de língua occitana/gasconha — hoje a população é  francesa moderna, mas a herança toponímica e cultural (Occitan: Fronçac) e a longa continuidade de povoamento mostram essa matriz regional.

Fronsac apresenta clima temperado oceânico, típico da margem direita de Bordeaux: outonos e primaveras amenos, verões quentes o suficiente para a maturação do Merlot e invernos frios moderados. A posição elevada de muitos vinhedos — com encostas que dominam o vale do Dordogne — ajuda a drenagem e à exposição solar. Os solos são um dos pontos fortes: “molasses” (camadas de argila e areia consolidadas), argilas-calcárias e seixos sobre subsolo calcário nas encostas mais altas. Essa diversidade (colinas de calcário/argila, planícies aluviais junto ao rio) favorece a
predominância de Merlot em solos mais pesados e Cabernet Franc nas parcelas calcárias, dando estrutura e minerais distintos às uvas.

Fronsac é uma AOC clássica da margem direita de Bordeaux, com cerca de 700–800 há e mais de uma centena de produtores. Merlot é a casta dominante (cerca de 60% da vinha), complementada por Cabernet Franc e pequenas parcelas de Cabernet Sauvignon — a lógica de corte segue a tradição do Right Bank: Merlot para redondeza e fruta, Cabernet Franc para nervo e perfume. Quanto aos métodos de vinificação, mistura de práticas tradicionais e modernas — poda adaptada, seleção de parcela, vinificações em aço inox e/ou betão para preservar fruta, e estágio em carvalho (parcial ou total) para estrutura. Nos últimos 20 anos houve investimento em renovação de vinhas, controlo de rendimentos e práticas de cave mais rigorosas que elevaram a qualidade média da região.

Os tintos (a grande maioria), tem normalmente Merlot como casta dominantes, apresentam cor profunda, aromas de frutas negras e vermelhas maduras (ameixa, cereja), notas terrosas, especiarias e, segundo o tipo de solo, toques minerais. Com taninos presentes mas macios (dependendo do corte e do estágio em madeira) — perfil que combina corpo médio-alto com boa suculência. Os brancos de Fronsac são muito pouco expressivos em volume na AOC (Fronsac é essencialmente produtora de tintos). Quando aparecem, são vinificados em estilos frescos e secos, mas não constituem a identidade da zona.

Os vinhos de Fronsac costumam envelhecer bem — muitos exemplares ganham complexidade entre 5 e 12 anos, e os melhores châteaux podem ultrapassar 15 anos em garrafa, dependendo do ano e do lote. Em geral, espera-se uma boa evolução de taninos e aromas.

Estes vinhos têm terroir marcantes e são uma ótima opção para quem quer conhecer vinhos de Bordeaux “raíz”, e, por aqui, há boas opções de rótulos, dos quais sugiro: Château de La Dauphine, ideal para guardar ou degustar com calma, Château Fan Carney A.O.C. Fronsac, produzido principalmente com Merlot, com taninos sedosos e bom corpo, Château Lalande Mausse, blend de Merlot e Cabernet Sauvignon, com potencial de guarda, Château les Tonnelles Prestige Fronsac, blend clássico, bom para quem quer experimentar Fronsac sem um rótulo ultra premium, Château Beauséjour Fronsac, outro tinto clássico de Fronsac, com estrutura interessante, Château du Gazin Fronsac, que vem de um vinhedo histórico, relativamente grande, que costuma ter vinhos consistentes, e o Château La Brande Fronsac Cabernet Franc, varietal de estrutura e personalidade.

Dados apontam que Fronsac exporta uma parcela significativa de sua produção (com mercados como China, EUA e países europeus entre os destinos), mas a exportação percentual e a visibilidade global ainda são menores que as de regiões vizinhas mais famosas. Em suma: Fronsac tem representatividade crescente — não é (ainda) uma estrela global, mas é um território importante para quem procura Bordeaux de carácter clássico sem preços de elite. Salut!

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.