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Guilherme Derrite deveria ter a hombridade e o bom senso de abrir mão da relatoria do PL Antifacção, que lhe foi dada de mão beijada por Hugo Motta, numa canhestra manobra eleitoreira com vistas a anaboliza-lo na disputa pelo Senado em 2026. O deputado e secretário de Segurança licenciado de São Paulo produziu até aqui nada menos que três esboços diferentes de texto, com um quarto na sequência enquanto este artigo é escrito, e, talvez, até outros mais adiante. Eis o resultado não de articulações e diálogo, mas de falta de prática legislativa e desconhecimento da legislação penal. Uma trapalhada política de dimensões tão superlativas que ele conseguiu desagradar a todos, inclusive aliados políticos no campo da direita.
O próprio Motta, padrinho da esculhambação, se viu obrigado a adiar a votação do projeto (um substitutivo deformado do já insuficiente projeto encaminhado pelo governo ao Congresso). Os governadores oposicionistas, entusiastas do endurecimento das regras e punições ao crime organizado, fizeram críticas públicas, deixando claro que foram alijados do diálogo pelo relator. “Quem opera a segurança pública são os estados. Não adianta fazer um projeto sem ouvir os estados”, disse Cláudio Castro, governador do Rio de Janeiro. Ao que consta, nem mesmo Tarcísio de Freitas, que nomeou Derrite para comandar a segurança em São Paulo, parece gostar do que foi produzido até aqui.
Os faccionados do PCC e do Comando Vermelho devem estar rindo a toa. Facilita o trabalho do crime organizado, afinal, que agentes políticos responsáveis por desenhar ações públicas sejam incompetentes ou incapazes de aprimorar os meios de combatê-lo
A rejeição ao texto de Derrite não vem apenas dos agentes políticos, mas também de nomes consagrados no combate ao crime organizado. E não estamos falando de qualquer sociólogo ou especialista de cabelo pintado, mas de gente como o promotor Lincoln Gakiya, que é jurado de morte pelo PCC. Em suas manifestações públicas, Gakiya tem sido um severo crítico de todas as versões do texto, apontando para o resultado nefasto que podem produzir na segurança pública.
Em entrevista para a Bandnews FM, Gakiya ressaltou a falta de diálogo, a pressa na apresentação do substitutivo e alguns dos principais aspectos das modificações propostas por Derrite, inclusive a inconstitucionalidade do que seria a limitação da atribuição investigativas da Polícia Federal e do Ministério Público, que teriam suas prerrogativas repassadas para a Justiça Estadual e a Polícia Civil.
A visão de segurança de Derrite é tão torta, tão primária, tão equivocada, que, aprovada uma das versões de sua proposta, um crime praticado contra o Estado Nacional (o crime de terrorismo por faccionado) seria investigado pela polícia local, apenas com o envolvimento das autoridades federais mediante autorização do governador. Não há lógica. Se perderia qualquer sistematização de política de combate ao crime organizado.
Derrite conseguiu um prodígio. Suas trapalhadas na relatoria do PL Antifacção conseguiram fazer o texto original do governo parecer razoável, e transformaram a bandeira da segurança pública de ativo da direita em flanco aberto para críticas de todos os lados. Os faccionados do PCC e do Comando Vermelho devem estar rindo a toa. Facilita o trabalho do crime organizado, afinal, que agentes políticos responsáveis por desenhar ações públicas sejam incompetentes ou incapazes de aprimorar os meios de combatê-lo. A melhor coisa que Derrite pode fazer pela segurança pública, no momento é “pedir para sair”, como diria o Capitão Nascimento.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos
