ICMS impostos
Tributação pesada sobre produção e consumo ajuda a camuflar o quanto o brasileiro realmente paga em impostos. (Foto: Marcelo Andrade/Arquivo/Gazeta do Povo)

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O Congresso aprovou a isenção fiscal para quem ganha até R$ 5 mil mensais, com um desconto para quem recebe até R$ 7,5 mil de salário. Estima-se que 15 milhões de pessoas serão beneficiadas. É o tipo de medida que compensará muito eleitoralmente, mas que não passa de uma “ilusão fiscal”.

O fenômeno das “ilusões fiscais” já tinha sido descrito em 1903 pelo economista Amilcare Puviani. A expressão, hoje, serve para classificar uma série de práticas e discursos relativos à tributação, como o fato de muitos impostos estarem escondidos nos preços dos bens e serviços que consumimos, de forma que ninguém nota e ninguém sabe quanto está pagando. Outra prática comum é a retenção na fonte, pela qual o imposto já é descontado na folha de todos os empregados assalariados, que não notam quanto de tributo está pagando.

Vale recordar, ainda, o caso das medidas temporárias que viram eternas. Em 1993, foi aprovado o Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras (IPMF), que duraria apenas dois anos, mas em 1996 foi reformulado como CPMF, e durou até 2007. A Desvinculação de Receitas da União (DRU) foi criada em 1994 com o nome de Fundo Social de Emergência (FSE), como medida temporária durante a implementação do Plano Real, mas foi prorrogado sucessivamente por mais de 30 anos. Governos também têm a mania de diminuir um serviço e não cortar os impostos: quando, por exemplo, o Estado vende uma empresa estatal deficitária, não precisa mais bancar essa empresa com recursos vindos de impostos. Quando as prefeituras inventaram o estacionamento “rotativo”, passaram a cobrar por um serviço que antes era gratuito. A arrecadação aumentou, mas não houve corte de outros impostos, o que equivale a um aumento na carga tributária.

Muitos impostos estão escondidos nos preços dos bens e serviços que consumimos, de forma que ninguém nota e ninguém sabe quanto está pagando

Governos também se aproveitam de eventos isolados e/ou prazerosos. Você já notou que bens e serviços relacionados a carnaval, Natal, casamentos, bebidas alcoólicas, heranças, loterias, venda de imóveis e jogos têm impostos em média mais altos? Isso acontece porque, nesses casos, o cidadão consome de qualquer forma, apressadamente, por entusiasmo, e não nota quanto imposto paga – a “elasticidade” é menor.

Há alguns discursos governamentais que refletem “ilusões fiscais”. Um deles é a tática do medo. Quando se fala em cortar impostos, a polícia diz que não terá dinheiro para patrulhar as ruas; as escolas afirmam que faltará merenda e papel higiênico, a Polícia Federal diz que não conseguirá emitir passaportes, os hospitais anunciam que faltarão remédios. Tudo para as pessoas ficarem com medo e passarem a acreditar que cortar impostos é ruim. Outro caso é o da aposentadoria mostrada como seguro. O Estado vende a necessidade de contribuir para o INSS como um seguro para sua velhice, mas na verdade a contribuição que você paga não é para a sua aposentadoria; é para os aposentados de agora. Quando você se aposentar, outros terão de pagar pelo seu benefício. O problema é que os países estão envelhecendo, e não haverá trabalhadores suficientes para bancar os aposentados do futuro. Além disso, o Estado exibe programas populares (como o Bolsa Família) como “prova” de que o dinheiro dos impostos está sendo bem usado, ou indo para quem mais precisa dele, enquanto destina verba muito maior para privilégios impopulares, como o “Bolsa BNDES”.

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As “ilusões fiscais” se refletem na dívida pública – quando você compra títulos do Tesouro, está emprestando dinheiro ao Estado, que paga a dívida e os juros com os impostos que arrecada. Essa é a dívida pública, também chamada “imposto sobre o futuro” – e na inflação, que não é o aumento de preços, e sim o aumento da massa monetária (promovido pelo Banco Central), cuja consequência é a elevação de alguns preços. Dessa forma, o BC acaba emprestando dinheiro ao Tesouro e, como as pessoas não percebem esse fenômeno, ele é chamado “imposto oculto”.

A verdade é que ninguém sabe quanto recebe de serviços estatais. É impossível calcular quanto cada um recebe na forma de serviços públicos. Quem recebe subsídios estatais ou tem filhos em universidades federais talvez receba mais que um brasileiro que não usa o SUS e paga escolas privadas, mas não há como calcular com exatidão o retorno dos impostos em nível individual. Isso gera a tendência a esconder as contas reais. Afinal, não sabemos quanto pagamos e quanto recebemos. As contas não são transparentes e são complexas.

Recordemos: o Congresso aprovou como lei ordinária uma isenção de impostos que, na verdade, era automática; ainda por cima, não cortou despesas e, junto com isso, aumentou impostos para quem ganha mais de R$ 50 mil. Em outras palavras, tivemos, de uma vez só, três ilusões fiscais em uma!

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos